A estiagem que castiga o Paraná há três anos chegou ao seu pior momento no início de 2022, com quebras significativas nas safras de grãos e desdobramento também na pecuária. Situações como essa, que fogem do controle do produtor rural, evidenciam a importância de incluir o seguro rural na gestão da propriedade, conforme o Canal Rural antecipou em janeiro.
Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), a estiagem foi o motivo de acionamento de mais de 42,5 mil apólices de seguro rural e 38,9 mil comunicados de perdas no âmbito do Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro) até o final de janeiro, totalizando mais de 81 mil acionamentos. Os estados mais atingidos pela seca foram Paraná, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo.
No Paraná, estimativas do Departamento de Economia Rural (Deral) da Secretaria da Agricultura e Abastecimento (Seab) dão conta de um prejuízo superior a R$ 30 bilhões em razão da seca. Como muitas áreas do estado ainda não finalizaram a colheita, o prejuízo pode ser ainda maior.
No início de janeiro, uma equipe técnica do Sistema Faep/Senar-PR foi a campo, acompanhando uma comitiva formada por membros do Mapa e da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), para verificar de perto os estragos causados pela seca extrema no interior do estado. Além de relatos sobre perdas severas, também foram ouvidas histórias de produtores rurais que tiveram dificuldades em acionar o seguro rural, pelo momento de atípica demanda no setor ou pelo desconhecimento dessa ferramenta de gestão de risco.
Na lavoura do produtor Gelson Horn, presidente do Sindicato Rural de Ampére, no sudoeste paranaense, a estimativa é de perdas de mais de 90% em função da seca. “Acredito que, neste ano, [a perda] vai ser na faixa de seis sacas por hectare. Nos anos normais, eram 61 sacas por hectare”, afirmou. Com produção de grãos e atividade pecuária na propriedade de 70,2 hectares, essa foi a primeira vez em que o produtor contratou o seguro rural para a área de soja. “Antes eu tinha o Proagro”, revelou.
O Proagro é diferente do seguro rural. “É um programa de governo para apoiar os produtores que tenham frustração de safra. Quem estabelece as taxas (alíquotas) é o Banco Central. A contratação acontece junto à instituição financeira e o valor máximo amparado é de R$ 335 mil. Aqui a participação das seguradoras é zero”, afirma o consultor em seguros rurais Luiz Antônio Digiovanni. “Já no seguro rural, quem define as taxas e, portanto, o custo do seguro é a seguradora. E cada uma faz sua análise de acordo com o histórico de informações. É aqui que entra o Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR), quando o governo define no orçamento o volume de recursos a serem aplicados na subvenção”, completa.
Nesse caso, o governo subvenciona, ou seja, arca com um percentual do custo de contratação do seguro rural. Essa subvenção varia conforme a cultura e o tipo de apólice. Para a soja, por exemplo, o governo arca com 20% do custo do prêmio do seguro. Já para os grãos de inverno, a subvenção varia entre 35% e 40%.
Perícia do seguro rural
No caso da lavoura de Horn, o perito da seguradora já fez a primeira visita após o acionamento do seguro. “Fui muito bem atendido. Ele foi bem atencioso. Daqui alguns dias ele volta na hora de a gente colher”, diz o produtor rural. Na segunda perícia, serão colhidos 5% da lavoura para efeito de amostragem, cuja produtividade servirá de base para a indenização do prejuízo.
O produtor e presidente do Sindicato Rural de São Miguel do Iguaçu, José Carlos Colombari afirma que muitas vezes, ao contratar o seguro rural, o produtor não sabe ao certo o que contratou e o que precisa obedecer. “Uma apólice tem muitas páginas, muitas cláusulas. O produtor não tem conhecimento de tudo aquilo. Seria preciso uma assessoria jurídica. Daí a importância de o corretor passar a situação correta, dar informação”, avalia.
Com o aumento no número de sinistros nos últimos anos, Colombari nota que muitos produtores que não tinham o costume de contratar seguro rural estão buscando mais informações a respeito. Soma-se a isso o fato de o custo dos insumos para a implementação das lavouras ter aumentado consideravelmente. “O produtor não tem como se arriscar nesta safrinha de milho, bem como na próxima safra de soja. Os custos de produção vão estar muito elevados. Não dá mais para o produtor plantar sem alguma segurança”, observa.
Essa situação preocupante, de produtores que fizeram o plantio com recursos próprios e não fizeram seguro rural ou Proagro, foi encontrada pela Faep, Mapa e Conab durante o roteiro pelo Paraná, em janeiro. Na ocasião, o diretor de Gestão de Risco da Secretaria de Política Agrícola do Mapa, Pedro Loyola, disse no oeste do Paraná que a situação era “devastadora”.
Nesses casos, os produtores estão descobertos diante da quebra da produção nas suas lavouras, tendo que arcar com os prejuízos. “Quem não fez seguro está em uma situação muito ruim. Eles têm a responsabilidade do custeio e das parcelas de investimento. Certamente estavam contando com os recursos da soja e não vão ter o que fazer. Muita gente está apavorada, muita gente que não sabe o que vai fazer”, relata o produtor Gerson Magnoni Bortoli, vice-presidente do Sindicato Rural de Umuarama, no noroeste do Paraná.
Ele mesmo acabou não segurando sua lavoura de soja nesta temporada. “Desde que comecei a plantar, em 2004, sempre produzi [o suficiente] para pagar os custos. Esta foi a primeira vez [em que não conseguiu cobrir as despesas]. Ainda está cedo para mensurar os estragos, mas a perda é grande”, lamenta.
Na região de Bortoli, a quebra nas lavouras de soja chegou a 90%, segundo relados de produtores locais. “Como nas últimas safras tivemos preços bons, eu estava capitalizado e banquei o custeio. Mas a maioria dos produtores não tem essa condição”, avalia o produtor, que já foi em busca do seguro para o milho segunda safra.
Maior valor segurado
Nos últimos anos, o aumento no preço das commodities agrícolas, em especial a soja e o milho, no mercado internacional elevou também o valor segurado. De acordo com o Atlas do Seguro Rural, do Mapa, o total pago pelos produtores brasileiros foi de R$ 799 milhões em 2019. Em 2020, esta soma atingiu 1,9 bilhão, e, em 2021, o número chegou a mais de R$ 3 bilhões.
Por outro lado, entre janeiro de 2019 e novembro de 2021, a soma das indenizações pagas aos produtores rurais brasileiros pelas seguradoras que operam no âmbito do seguro rural chegou a R$ 9,5 bilhões.
Ainda segundo o Mapa, mais seguradoras foram habilitadas para operar no sistema, chegando a 18 empresas em 2022. No mesmo compasso, o número de peritos praticamente dobrou em três anos, totalizando 1.178 profissionais.
“O produtor rural precisa entender que o seguro rural é uma importante ferramenta dentro do planejamento da safra, tanto quanto a compra de semente, de fertilizante ou de maquinário. O seguro rural traz uma segurança financeira, em eventual perda. E, em tempos de alta nos custos de produção, o produtor não pode correr risco desnecessários, ainda mais sabendo que as lavouras estão à mercê das intempéries climáticas”, pontua Ágide Meneguette, presidente do Sistema Faep/Senar-PR.
Faep/Senar-PR fomenta a contratação
O Paraná é o estado que mais contrata apólices de seguro no país. Em média, os produtores rurais paranaenses respondem por 38% do total das contratações. Em 2021, os agricultores foram responsáveis pela contratação de 84 mil das 217 mil apólices em todo Brasil.
O Paraná também tem, desde 2009, um programa próprio de subvenção ao prêmio do seguro rural. Em 2020 foram disponibilizados R$ 15 milhões em subvenção, dos quais foram utilizados pouco mais de R$ 11,7. Para 2021, inicialmente foram liberados R$ 2,85 milhões e confirmado o valor total de R$ 10 milhões para atender 28 culturas e pecuária, com os produtores podendo contar com 13 seguradoras participantes do programa.
O avanço na cultura de contratação do seguro rural entre os produtores rurais tem participação direta do Sistema Faep/Senar-PR. Desde o começo do Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural, criado em 2003, a entidade promoveu caravanas pelo Paraná levando seguradoras e governo para debater com os produtores e sindicatos. Em 2012, a Federação patrocinou um estudo que mostra a importância econômica do seguro rural para o país.
Em 2016, a Faep, em parceria com a Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg), Confederação Nacional de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e Ocepar, organizou o Fórum Nacional de Seguro Rural. Mais recentemente, desenvolveu e colocou à disposição, desde 2020, um curso específico sobre seguro rural.
“Desde o começo, o Sistema Faep/Senar-PR está envolvido em disseminar a cultura do seguro rural entre os nossos produtores, pois sabemos da importância desta ferramenta. E vamos continuar trabalhando para isso, pois essa safra de verão deixa ainda mais evidente quanto é fundamental”, destaca Ágide Meneguette, presidente da entidade.
Curso de seguro rural
Atento à necessidade de mais informação para difundir a cultura do seguro rural no estado, o Sistema Faep/Senar-PR lançou, em 2020, o curso “Seguro agrícola para grãos”.
A capacitação tem como objetivo orientar o produtor e profissionais da área a utilizar a ferramenta de gestão de riscos. A formação é gratuita e já tem seu calendário para as turmas de 2022.