Especial

Série do Canal Rural ouve governadores sobre efeito da Covid-19 no agro

Para entender como cada unidade federativa tem enfrentado a epidemia e atuado para ajudar o agronegócio, convidamos os representantes de alguns dos principais estados produtores para falar sobre as medidas adotadas; confira

O Canal Rural deu início em abril  a uma série de entrevistas com governadores dos principais estados do agronegócio no Brasil. A pandemia do novo coronavírus foi um dos temas abordados em todas as entrevistas, para revelar quais medidas estão sendo tomadas nas unidades federativas e quais são os principais desafios para manter o setor produtivo funcionando.

Com o avanço da Covid-19 pelo país, mesmo nas atividades consideradas essenciais há sempre a preocupação com a saúde dos trabalhadores, o fortalecimento da logística e a queda de consumo.

Confira o que cada governador disse sobre seu estado:

O governador de Mato Grosso, Mauro Mendes, afirmou que apesar de o Tribunal de Contas  (TCE-MT) ter liberado o uso de recursos do Fundo de Habitação e Transporte (Fethab) no combate ao coronavírus, o estado não irá aderir à sugestão do uso de verbas destinadas para logística.

“Já adianto que essa não será uma decisão que vai alcançar o governo de MT. Eu não vejo legalidade nisso, porque o TCE não pode passar por cima de uma lei que claramente tem diretrizes sobre a aplicação desse dinheiro. O governo não vai tirar neste momento nenhum dinheiro da infraestrutura que tem origem do Fethab para investir em outro setor”, disse Mendes.

Combate à Covid-19

Mendes falou também sobre as medidas que está tomando para combater o avanço do coronavírus no estado e sobre o impacto da quarentena na economia local, já que o governa havia emitido um decreto com recomendação às prefeituras locais para que não adotassem medidas de isolamento.

“Na verdade, no nosso decreto, criamos alguns parâmetros. Ao meu ver, existe uma super exposição desse tema, o que está causando medo, pânico, e no meio disso, tenho visto muitas medidas serem tomadas, um pouco antecipada, fora do tempo. Um exemplo disso é que cidades tanto em Mato Grosso quanto no Brasil, que ainda não haviam registrado nenhum caso de coronavírus, e prefeitos e até governadores decretaram o fechamento de todo o comércio. Ou seja, como você cria medidas protetivas se você ainda não tem nenhum caso de contágio. Então isso é uma medida de antecipação, que é correta mas é preciso aplicá-la no momento correto”, explica o governador.

“Então no estado, adotamos um critério objetivo, que foi: enquanto houver uma taxa de ocupação de leitos de UTI abaixo de 60%, nós estamos recomendando aos prefeitos que não adotem medidas restritivas, mas que ao mesmo tempo adotem medidas de prevenção, para evitar aglomerações, uso de máscaras. Aliás, fomos o primeiro estado a tornar obrigatório o uso de máscaras, criamos uma multa, estamos fiscalizando, as pessoas estão aderindo. Há locais em que você entra hoje e 100% dos funcionários e clientes estão usando máscaras. Isso está permitindo que tenhamos uma taxa de ocupação das nossas UTIs de 4,5%, ou seja, 95% dos leitos exclusivos para o coronavírus estão desocupados”, disse.

Isolamento

Em Mato Grosso, a decisão de retomada será tomada pelos prefeitos de cada cidade. Com isso, há um temor que as decisões em relação ao isolamento possam voltar a interferir na logística, como aconteceu em março, onde a circulação de caminhões foi proibida. Mas, segundo Mauro Mendes, neste momento, os prefeitos estão mais “conscientes”.

“Hoje, eu diria que 95% da atividade economia no estado está acontecendo com normalidade. Trabalhando nas suas atividades econômicas com um excelente regime de continuidade. O que nós estamos pedindo aos prefeitos é que mantenham suspensas ainda reuniões, festas, shows e abertura de cinemas, que obviamente são de menor impactos no dia-a-dia. Bares e restaurantes ainda estão fechados. Mas o comércio, indústrias e as cadeias do agronegócio estão funcionando. O governo mesmo volta a trabalhar em regime normalizado, oito horas por dia já no próximo dia 11, ficarão em casa, apenas, aqueles que fazem parte do grupo de risco”, afirmou ele.

“Estamos seguindo as recomendações da Organização Mundial da Saúde, que classifica a paralisação de acordo com a capacidade de atendimento de saúde de cada lugar. Então, se nós temos capacidades de atender às pessoas o nível de ocupação é baixo no estado, por que preciso fazer uma paralisação geral? Agora é fato, se o número de casos começar a crescer, nós vamos tomar novas medidas restritivas para diminuir essa curva de crescimento, e não ultrapassar a capacidade da saúde”, enfatizou o governador.

Prejuízo no agronegócio

No geral, para o governador, os setores do agronegócio se mantêm ainda estabilizados. “O agro estão indo bem, a exportação de soja por exemplo, com preços em função do dólar está razoável também. Mas o mundo está passando por temores, de incerteza. O algodão, por exemplo, ninguém sabe como pode ficar. Grande parte da safra está vendida. A dúvida é: será que esses players vão honrar com esses contratos? Existe hoje um oceano de incertezas, uma incerteza maior ainda porque ninguém sabe a profundidade e as consequências na economia no Brasil e no mundo”, afirma o governador de Mato Grosso.

 

O governador do Paraná, Ratinho Júnior, afirmou que está trabalhando para ajudar os produtores de leite afetados pelo novo coronavírus. Ele disse que o governo tem buscado dar amparo aos pecuaristas comprando parte da produção de pequenos produtores e transformando em leite em pó.

“Assim, conseguimos distribuir para a rede de ensino, através do programa que dá leite para crianças mais humildes e também em parceria com pequenos laticínios”, disse. Ele lembra ainda que o Paraná possui a segunda maior bacia leiteira do Brasil.

O governador afirmou também que o estado ampliou a compra de produtos da agricultura familiar, atendendo cerca de 280 mil famílias com o programa da merenda em casa. “Quase tudo é comprado da agricultura familiar. Dentro da possibilidade, estamos fazendo investimentos de R$ 100 milhões por mês”, afirmou.

Segundo ele, o agronegócio do estado apresentava bom ritmo de crescimento antes da pandemia, com o Valor Bruto da Produção Agropecuária (VBP) atingindo R$ 88 bilhões.

Seca

O bom momento que o setor vivia foi afetado também pela seca no estado, que é a pior dos últimos anos. A estimativa é que o milho segunda safra e o feijão sejam as culturas mais afetadas pela falta de chuva.

“O auxílio [aos afetados] acontece através de agências de fomento. Temos o BRDE [Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul], alinhado com o BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social], e toda a linha, boa parte dela está para atender cooperativas e produtores. Também temos a Fomento Paraná, que é uma agência de fomento do estado que está a disposição no sentido de auxílio de produtores que terão um possível prejuízo”, comentou.

Outra medida que está em tramitação é o aporte de R$ 20 milhões para alavancagem do seguro rural. “Mas ainda é pequeno diante da necessidade. Estamos tentando conversar com o Banco do Brasil, através do Ministério da Agricultura, para securitizar esse processo”.

Coronavírus

A expectativa é que nesta segunda-feira seja realizada uma reunião entre o governador, Ministério Público, Casa Civil e Secretaria da Saúde para montar um plano de reabertura do comércio, do estado como shoppings e igrejas.

“Para que não se tenha depois uma decisão tomada de qualquer tipo, onde um promotor entre e discuta isso na Justiça, estamos alinhando com o Ministério Público para que se tenha uma sinergia”, ressaltou.

A possibilidade de um colapso da indústria de carnes por conta da pandemia do novo coronavírus é a grande preocupação do governador de Goiás, Ronaldo Caiado. Ele destacou que as unidades de abate estão seguindo regras extremamente rígidas há dois meses para evitar surtos.

Entre as ações diárias estão o distanciamento de funcionários nos postos de trabalho e locais de alimentação; o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs); a medição da temperatura de todos os funcionários antes da entrada no frigorífico, já que febre é um dos primeiros sinais da covid-19; afastamento de funcionários com 60 anos ou mais ou que tenham comorbidades.

Caiado comparou as ações às tomadas na indústria americana de carnes. Segundo ele, os Estados Unidos achavam que a pandemia era “bobagem” e não tiveram nenhum critério ou regra sanitária extra diante disso. “Nós, com essas medidas, esperamos que tendo alguns casos, eles não venham a provocar um colapso na indústria”, diz.

O governador destaca que o registro de um caso entre funcionários de uma unidade de abate não levará ao fechamento do local. Ele afirma que pessoas que tiveram contato com o infectado serão examinados para saber se houve transmissão no local. “O que vimos nos EUA [fechamento de frigoríficos foi que a extensão do número de casos levou a indústria a ter que fechar”.

 

Setores em estado de atenção

O setor leiteiro é um dos que mais sentiu a crise, segundo Caiado. “A pecuária de leite é sempre muito sensível a situações como essa. Ela precisa que tenhamos um olhar diferente, para que não deixemos ter perda significativa de renda para os produtores”, ressalta.

Segundo o governador, dois pilares que já existiam antes da pandemia estão amenizando o impacto. “Temos uma câmara constituída, com preço pré-fixado com antecedência. Não é como antigamente, quando o produtor ficava sabendo o preço 45 dias após a primeira entrega”, diz. “Em segundo lugar, a perda de renda faz com que o produtor tenha ter que maior rapidez na obtenção de empréstimo. Temos o fundo de aval do Sebrae que está facilitando o acesso ao FCO [Fundo Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste], que atende principalmente municípios mais carentes e aqueles que são dependentes totalmente da atividade rural”, complementa.

Outro setor que também vive um momento bastante complicado é o sucroalcooleiro, e não só por conta da pandemia. “A baixa do preço do petróleo, chegando a patamares preocupantes, tira competitividade do etanol. Estamos buscando junto ao governo federal uma alternativa, principalmente para o etanol, porque o açúcar ainda tem o mercado internacional”, afirma.

Caiado afirma que o biocombustível precisa de ações do governo federal. “O que podemos fazer é dar exemplo, mostrar que já demos incentivo. Hoje, isentamos grande parte do ICMS dessas estruturas [usinas] A parte do estado nós já fizemos com a renúncia fiscal”, diz.

O governador conta que as medidas de apoio à produção de etanol só devem voltar à pauta do governo na próxima semana. Por enquanto, o assunto debatido em Brasília com os governadores são as formas de equilibrar a perda de arrecadação dos estados. “A matéria [do etanol] não evoluiu a ponto de ter uma decisão”, afirma.

 

 

O maior estado da região Sul, Rio Grande do Sul, registra menos casos confirmados pelo novo coronavírus e a menor taxa de letalidade pela doença. Isso porque o governo estadual começou a adotar bem cedo as medidas restritivas como fechamento do comércio e isolamento social. O  governador Eduardo Leite explicou como a adesão da população ao isolamento tem feito a diferença no estado, que é o terceiro maior produtor de soja do Brasil e possui um dos maiores rebanhos de suínos e pecuária leiteira do país.

“Nós temos uma baixa velocidade da disseminação em relação a outros estados. A taxa diária que temos é menor e temos menos óbitos em relação aos estados da região Sul, apesar de termos uma população maior”, disse Leite.

Eduardo Leite anunciou quais vão ser as medidas de agora em diante para evitar que os casos voltem a subir no estado. Uma delas é adotar restrições de acordo com as mesorregiões. “Devemos regionalizar o estado em 21 áreas e definir, a partir da capacidade hospitalar e velocidade de propagação do vírus naquela região, o nível de restrição que ela tem que ter”, disse.

 

O governador ainda destacou os programas anunciados para apoiar os produtores rurais que sofreram com a estiagem, como a renegociação de dívidas, em parceria com o governo federal. “Dobramos os recursos para o programa de sementes forrageiras.É um programa que subsidia 30% do valor da sementes forrageiras que serão utilizadas na formação das pastagens e alimentação dos rebanhos. Também o programa troca troca de sementes, que terá o prazo prorrogado de pagamento de contratos até 31 de maio”, disse.

Eduardo Leite ainda citou o programa estadual de produção e qualidade do milho e a realização de perfuração de poços artesianos no interior do estado.  “Também buscamos juntos ao governo federal soluções para renegociações de dívidas de empréstimos que deveriam ser pagas com a safra e poderão ser alongadas em até 7 anos”, concluiu.

 

Apesar da crise causada pela pandemia do novo coronavírus, a agricultura de Roraima continua crescendo, principalmente na cultura da soja, afirmou o governador Antonio Denarium, em entrevista ao Canal Rural. “Aqui, plantamos na entressafra do Brasil, pois estamos localizados acima da linha do Equador, então plantamos no mesmo calendário americano”, destaca.

Segundo Denarium, em 2019, o estado cultivou cerca de 40 mil hectares de soja. “Em 2020, tivemos um crescimento de mais de 20%, vamos plantar 50 mil hectares de soja e a produtividade tem remunerado muito bem todos os produtores”, acrescenta.

Agricultura familiar

O governador falou ainda sobre as medidas tomadas para trazer um socorro para a agricultura familiar. “Nós usamos todos os recursos do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e também recursos próprios do governo do estado e das cooperativas de agricultura familiar”, conta.

Com a paralisação das aulas, Denarium conta que foi decidido em reuniões com as cooperativas, Secretaria de Agricultura e Secretaria de Educação, que o governo retomará as compras da agricultura familiar. “Também com a reabertura de supermercados, que já estão atendendo seguindo o critério de segurança, a economia vai se restabelecendo”.

 

Logística

Em relação ao escoamento de produção na fronteira agrícola de Roraima, o governador falou sobre o projeto Rota do Futuro, que vai reduzir pela metade o tempo do transporte. Atualmente, o trajeto é feito pelo Porto de Manaus e o navio leva oito dias para chegar até o Canal do Panamá. Com a nova estrada, o embarque é feito em Boa Vista, capital de Roraima, que fica a 680 quilômetros do Porto de Georgetown, na Guiana Francesa.

“Só faltam 400 quilômetros para o trecho ficar totalmente pavimentado. Com essa nova rota nós vamos estar apenas a 680 km do Porto de Georgetown, na Guiana. Depois até o Canal do Panamá vai demorar apenas quatro dias no navio, com isso nós vamos reduzir o custo de produção de Roraima”, finalizou.