Uma agricultura sustentável, com geração de renda e conservação ambiental, que contribui para o alcance de três dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), propostos pela ONU: ODS 1, erradicação da pobreza; ODS 2, fome zero e agricultura sustentável e ODS 15, proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres. Esta é a realidade do cultivo de pupunha para palmito no litoral do Paraná, com o apoio da Embrapa Florestas.
As ações sustentáveis praticadas pelos produtores brasileiros foram destacadas pelo presidente da Embrapa, Celso Moretti, em entrevista exclusiva ao Canal Rural, durante a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP26).
O litoral paranaense tem fortes restrições para desenvolvimento da agricultura, por estar em uma área de preservação da Mata Atlântica. Até cerca de 20 anos atrás, havia o extrativismo de palmito-juçara (Euterpes edulis), nativo da região, mas que, ao ser colhido, provoca a morte da árvore.
Hoje, esta espécie encontra-se em extinção e com a colheita proibida por lei. Várias práticas agrícolas e pecuárias foram introduzidas ao longo do tempo, mas poucas apresentaram bons resultados, devido às condições desfavoráveis de clima, solo e retorno econômico.
A transformação na produção e na economia litorânea foi impulsionada pelo Projeto “Pupunha para palmito na agricultura familiar”, desenvolvido pela Embrapa Florestas e parceiros, no período de 2000 a 2020.
O projeto fortaleceu, para produção de palmito na região, o cultivo de pupunha (Bactris gasipaes), nativa da região Norte do Brasil, onde é cultivada para produção de frutos. Segundo Álvaro Figueredo dos Santos, pesquisador aposentado da Embrapa Florestas e responsável pela execução do projeto, observou-se que “a pupunha poderia ser uma boa alternativa aos agricultores familiares”.
Durante os 20 anos de trabalho, “a pesquisa apontou caminhos para o sistema de produção, como espaçamento, adubação, tratos culturais, cuidado com doenças e também inovações na forma de processamento”, conta o pesquisador. “E parte do sucesso se deve à conjunção de esforços entre órgãos de pesquisa e de assistência técnica e extensão rural”, comemora. De sabor mais adocicado quando comparada com o palmito de juçara, hoje o consumo de palmito de pupunha é uma realidade no dia a dia do consumidor, que encontra com facilidade em mercados e restaurantes, seja em conserva ou in natura.
Um dos diferenciais da pupunha é sua capacidade de rebrotar e continuar produzindo por mais 15 anos, com colheitas anuais. O fato de o produto in natura não oxidar e a planta começar a produzir 18 meses após o plantio são outras vantagens importantes da espécie, bem como a adaptação às condições edafoclimáticas da região.
Segundo Emiliano Santarosa, analista da Embrapa Florestas responsável pelas ações de transferência de tecnologia, “aliado às condições edafoclimáticas favoráveis ao cultivo, a adoção de boas práticas no sistema de produção de pupunha, como mudas de qualidade, adubação e manejo, permite ao produtor obter produtividade e qualidade satisfatória no palmito produzido, sendo uma alternativa de renda e agregação de valor também em pequenas propriedades, além da possibilidade de agroindústrias”.
Deu certo e os números comprovam: no ano 2000, o número de mudas plantadas de pupunheira na região não chegava a 100 mil. Hoje, são cerca de 10,1 milhões de plantas de pupunha, cultivadas por aproximadamente mil agricultores em uma área de 2.030 hectares, que engloba os municípios de Paranaguá, Morretes, Antonina, Guaraqueçaba, Pontal do Paraná, Matinhos e Guaratuba. Os dados são do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-PR), um dos parceiros do projeto.
A produção cresceu em média 26% durante o período 2000-2020 e o valor bruto do palmito no Paraná passou de R$ 480 mil em 2001 para R$ 50,2 milhões em 2019. A matéria prima é beneficiada por nove agroindústrias, gerando emprego e renda na região.
Sebastião Bellettini, extensionista do IDR-PR, responsável pelo incentivo e atendimento aos produtores afirma que “a saída ao produtor rural aqui da região é diversificar. A pupunha se encaixa, então, como uma cultura de médio a longo prazo. Além disso, é um cultivo com tratos culturais relativamente fáceis e não precisa ser colhida exatamente em um período. Se o produtor quiser atrasar a colheita em um ou dois meses, por exemplo, não terá problemas”.
Produção
Morador de Paranaguá, no litoral do Paraná, há mais de 50 anos, o produtor rural Vilson Cordeiro dos Santos cultiva pupunha em uma área de cerca de 10 hectares. “Minha propriedade tem bastante umidade e ninguém acreditava que eu pudesse ter lucro. Hoje, a pupunha é a garantia do meu sustento e também da minha família”, comemora.
Análise de impacto e novas pesquisas
O cultivo de pupunha para palmito tem sido objeto de análise de impacto, realizada pela Embrapa Florestas, desde 2018. As análises demonstram que, devido à manutenção da área com o uso da tecnologia para produção de pupunha, os benefícios econômicos gerados pela tecnologia em 2020 foram equivalentes a R$ 6,5 milhões. Para Bellettini, do IDR Paraná, “isso representa um valor considerável para uma região com tantas restrições à produção rural, como é aqui”.
Segundo o analista Emiliano Santarosa, “estes dados demonstram a importância econômica, social e ambiental do sistema de produção de pupunha e também o potencial da atividade para a região, sendo um resultado do trabalho desenvolvido em parceria entre as instituições, incluindo pesquisa, ações de transferência de tecnologia e extensão realizados nos últimos anos, fazendo este conhecimento chegar na ponta e auxiliando com alternativas para os produtores”.
Um dos gargalos apontados é a produção de mudas de qualidade, o que já vem mudando com o passar dos anos. “Atualmente já existem alguns viveiros que produzem mudas de qualidade na região Sul e São Paulo”, ressalta Santarosa, “mas o custo das mudas ainda permanece como principal fator de custo da implantação, por isso a recomendação é que sempre devem ser buscados viveiros e mudas de qualidade para o plantio para garantir a qualidade do investimento”.
Além disso, o trabalho de pesquisa da Embrapa Florestas continua, com projetos de melhoramento genético, produção de mudas por clonagem, processamento e beneficiamento da pupunha, entre outros. Ações de transferência de tecnologia e parceria junto ao IDR-Paraná através da Agenda Comum também devem continuar visando a difusão de conhecimentos e tecnologias para o sistema de produção.
Parcerias
O sucesso do palmito de pupunha no litoral do Paraná foi fruto de uma ampla rede de pesquisa e extensão organizada pela Embrapa Florestas e formada por várias instituições. As pesquisas trabalharam em diferentes frentes: regiões litorâneas do Paraná, Santa Catarina e São Paulo; e região de Maringá, Norte do Paraná.
O projeto foi executado com a Emater-PR e Instituto Agronômico do Paraná (que, hoje, formam o Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná – IDR Paraná), Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri), Universidade Estadual de Maringá, Universidade Estadual de Ponta Grossa, Universidade Federal do Paraná, Faculdades ‘Espírita’, Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Estadual de Ponta Grossa, e diversas secretarias municipais de Agricultura, além de produtores rurais.
O trabalho recebeu financiamento do Projeto de Apoio ao Desenvolvimento de Tecnologias Agropecuárias para o Brasil (Prodetab), além dos editais da Embrapa. O fomento ao plantio foi feito com recursos do governo do estado do Paraná e dos municípios, sob coordenação do IDR-PR. Enquanto no estado de Santa Catarina, também se ressalta a parceria junto à Epagri, no desenvolvimento de pesquisa e transferência para atividades de produção de palmito.