Uma cianobactéria, também conhecida como alga verde-azulada, serve de base para novo bioinsumo que potencializa respostas fisiológicas de crescimento e defesa das plantas. Trata-se de um biofertilizante que contém um microrganismo coletado da biodiversidade brasileira e que faz parte do banco de germoplasma da Embrapa Agroenergia. O resultado é um sinalizador químico que induz e aprimora alguns processos fisiológicos em vegetais resultando em maior vigor e produtividade.
A tecnologia foi desenvolvida por meio de parceria entre Embrapa, empresa Dimiagro, especializada no mercado de fertilizantes, Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e Empresa Brasileira de Inovação Industrial (Embrapii).
Consiste na mistura de extratos secos de uma cianobactéria com um fertilizante foliar que contém nitrogênio, fósforo e potássio, além dos micronutrientes boro, zinco e molibdênio. O novo produto pode ser categorizado como bioestimulante.
“Em condições específicas de crescimento, a cianobactéria produz boas quantidades do fitormônio ácido índole-3-acético, que é um sinalizador químico para a multiplicação de células e tecidos, e de ácido salicílico, relacionado à estimulação do sistema de defesa das plantas”, explica o pesquisador da Embrapa César Miranda, líder do projeto Macrofert.
As avaliações da aplicação do bioinsumo desenvolvido pela Embrapa demonstraram que, em condições controladas em casa de vegetação, as produções de soja e milho foram favorecidas de forma significativa e tiveram um aumento no crescimento e enraizamento das plantas de até 10%.
“Observamos que as plantas que receberam o produto ficaram mais vigorosas e produtivas em comparação às que não receberam a aplicação”, conta Miranda. Os resultados foram semelhantes aos registrados quando se aplicou doses semelhantes do fertilizante foliar com extratos da macroalga Ascophyllum nodosum, nativa do norte do Oceano Atlântico, prática já difundida no mercado e que tem boa aceitação especialmente entre os produtores de soja.
Indicado para aplicação nos períodos de maior demanda de energia pelas plantas, o uso de biofertilizantes garante um aporte adicional de nutrientes essenciais em fases críticas da cultura, como no período de floração das plantas.
“A adição de fitormônios de forma exógena pode favorecer o melhor aproveitamento dos nutrientes, melhorando a eficiência de sua utilização no momento em que a planta estabelece os parâmetros que definirão a produção final de grãos”, acrescenta o pesquisador.
Ele esclarece que, em condições adversas, seja devido ao clima, ao ataque de pragas ou à limitação de nutrientes essenciais, esse aporte extra favorece um equilíbrio no desenvolvimento da planta, o que resulta em aumento de produtividade.
Aceitação no mercado e escala de produção
No mercado nacional já estão disponíveis várias marcas de fertilizantes foliares com extratos de macroalgas, em sua maioria importados, já que a legislação brasileira não permite a extração de algas da costa marinha. Dessa forma, a ideia inicial do projeto de pesquisa era encontrar um substituto com eficiência semelhante ou melhor do que os extratos importados para a formulação de fertilizantes à base de algas.
“A cianobactéria que compõe o nosso extrato é totalmente cultivada em laboratório, em um processo limpo e sem a geração de resíduos. Isso permite utilizar essa espécie da biodiversidade brasileira sem explorá-la de forma extrativa e causar danos ao ambiente. Além de garantir um produto de qualidade controlada”, explica o cientista da Embrapa.
Miranda conta que o uso de fertilizantes à base de macroalga importada ainda é pouco comum entre agricultores brasileiros, e os sojicultores são os que mais adotam essa tecnologia atualmente. O pesquisador salienta, porém, que a prática vem crescendo nos últimos anos, especialmente porque os produtores já conhecem os efeitos de insumos biológicos aplicados à soja, como os que inoculam a bactéria bradyrhizobium para a fixação biológica de nitrogênio.
“O novo extrato produzido pela Embrapa favorecerá a disseminação do conhecimento entre os produtores, que buscam alternativas biológicas que garantam a estabilidade da produção frente a condições adversas de clima e disseminação de pragas e doenças”, declara o pesquisador.
O CEO da Dimiagro, Grégori Boligon Vieira, acredita que, com a produção das algas no Brasil, será possível diminuir os custos com importação, gerando mais empregos nesse meio. “Tendo um extrato de algas com mais fitormônios que estimulam o sistema vegetativo, reprodutivo e de defesa das plantas, consequentemente, iremos aumentar a produtividade”, prevê.
Ele ressalta que outra vantagem do extrato de cianobactéria da Embrapa é a grande quantidade de fitormônios expressados em sua biomassa após processo de secagem em estufa a temperaturas controladas, o que é essencial para se obter escala de mercado.
Em escala de produção laboratorial, a técnica de produção da cianobactéria é simples e demanda formação técnica de nível médio e conhecimentos básicos de laboratório, com ênfase em microbiologia. As condições de laboratório para manutenção da cianobactéria também são relativamente simples.
Os testes para aumentar a escala de produção terão início em 2021, quando começa a segunda fase do projeto Macrofert. “Vamos iniciar um ciclo de pelo menos mais dois anos de experimentação e aprimoramento para ter certeza do potencial real de produção de extratos algais para atender a demanda do mercado nos padrões atuais de uso”, afirma Miranda. A segunda etapa da pesquisa também incluirá análises sobre o custo de produção e estudos de campo em condições reais de produção.
Bioinsumos brasileiros em franco crescimento
O governo federal, por meio do Ministério da Agricultura, lançou em maio de 2020 o Programa Nacional de Bioinsumos. O objetivo é a valorização da biodiversidade brasileira como matéria-prima para novos insumos agrícolas. A Embrapa já desenvolveu várias soluções relacionadas nessa área, como tecnologias para a fixação biológica de nitrogênio e para a solubilização de nutrientes como o fósforo.
De acordo com a Secretaria de Comércio Exterior (Secex), ligada ao Ministério da Economia, em 2018 o Brasil importou 31 milhões de toneladas de fertilizantes, a um custo estimado de US$ 9 bilhões.
A Embrapa Milho e Sorgo (MG) desenvolveu, em uma parceria público-privada, um inoculante para solubilização de fósforo já lançado no mercado, o BiomaPhos.
A Embrapa Agroenergia está desenvolvendo um projeto cofinanciado pela Embrapii, em parceria com a empresa Satis, também com o propósito de solubilização de fósforo. O objetivo do projeto é selecionar microrganismos da biodiversidade brasileira que solubilizem o fósforo retido no solo, contribuindo para dar maior eficiência ao uso desse nutriente que ainda não está biodisponível para a planta, relata a pesquisadora Mônica Damaso, coordenadora do projeto com a Satis.
“O produto a ser desenvolvido via parceria poderá diminuir a importação de fertilizantes e com isso reduzir a dependência externa e a vulnerabilidade do agricultor brasileiro frente às flutuações do mercado”, informa a pesquisadora, acrescentando que o produto em questão terá grande potencial para trazer ganhos tanto para o produtor quanto para a balança comercial brasileira.