É no momento de crise que a solidariedade do ser humano ganha força. E por que não dizer que é também em meio ao caos que a criatividade do brasileiro se destaca ainda mais. Com os restaurantes fechados, feiras livres vazias e aulas suspensas, os produtores de orgânicos de Santa Catarina se viram diante de uma realidade inesperada. Sem ter para quem vender, foi preciso pensar em novas alternativas para manter o sustento da família.
Ricardo Pilger, agricultor de Joaçaba, oeste de Santa Catarina, produz orgânicos desde 2010 e há quatro anos possui o certificado que trouxe valor agregado aos seus produtos. Dona Delisa, de 69 anos, é o seu braço direito. Juntos, mãe e filho, trabalham duro na horta de um hectare. Boa parte da produção da família era direcionada para a merenda escolar.
Com as aulas suspensas, Ricardo resolveu criar um grupo no WhatsApp para oferecer seus produtos. Em uma semana, o atendimento passou de 90 para 230 clientes. Com o aumento na demanda, Ricardo acredita que a renda no mês de abril vai dobrar de tamanho. ”Hoje, com os pedidos que temos e o volume que estamos conseguindo oferecer, eu dobrei a minha capacidade de entrega e arrecadação. Se continuar nesse ritmo, vou passar de R$ 4 mil para R$ 8 mil por mês”, enfatizou.
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O agricultor pretende continuar com as entregas, mesmo depois que a crise passar. ”Eu acredito que pelo menos 40% dessa clientela vai continuar. O negócio aqui está bombando, muita gente ligando e pedindo. Chegou ao ponto que estou pensando em contratar alguém pra me ajudar”.
No sul do estado, no município de Araranguá, há um ano, dois jovens irmãos redirecionaram a produção de hortaliças do modo convencional para o orgânico. Com a ajuda da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri), mudaram o modelo de negócios. A entrega é feita em cestas contendo vários alimentos, de acordo com a produção da semana.
”A gente disponibiliza a lista para os clientes e eles podem fazer a escolha. A cesta pode ser montada com 5, 8 ou 12 itens. Eles enviam a listagem com o que querem e a gente entrega em domicílio”, comentou André Francisco.
Durante o período de quarentena, com mais gente almoçando em casa, eles reforçaram a divulgação nas redes sociais. ”A gente intensificou mais ainda a divulgação no Instagram e Facebook, além do WhatsApp, e estamos bem contentes com o resultado. Dobraram as nossas entregas de cestas e isso é muito importante para gente que ficou na lavoura neste período”.
”O que a gente pede é que as pessoas continuem em casa, principalmente os idosos, porque a gente está trabalhando, estamos no campo desenvolvendo nossa atividade rural e vamos levar os alimentos até essas pessoas”, disse Murilo Francisco.
Com tato para as vendas, além dos próprios produtos, os irmãos Francisco revendem a produção dos agricultores vizinhos.
A honestidade na hora de repassar os preços dos outros produtores convenceu o Luis Carlos e a Cleide Florêncio, também de Araranguá, que agora fazem parte desta rede de delivery. ”Já entregamos para eles maracujá e pitaya. As hortaliças já estão no ponto de colher e vamos repassar também”, comentou.
A parceria entre eles deve continuar depois da crise. ”Eles já me pediram orgânicos de raízes, que é mais raro encontrar no mercado. Então, vou produzir também batata, aipim e inhame”, disse Florêncio.
Ajuda especializada
A Epagri tem auxiliado vários produtores neste momento para ajudar a encontrar soluções para vender, até que o isolamento social acabe e as escolas e restaurantes voltem a abrir.
”A gente ajuda na divulgação. Os agricultores que já entregavam estão entregando o dobro e os que não entregavam, que tinham batata doce e aipim, por exemplo, também estão conseguindo entregar nas casas, porque a demanda nos supermercados caíram. Com essa divulgação eles estão conseguindo entregar direto no consumidor”, afirmou Luciana Ferro Schneider, extensionista da Epagri.
Entre as orientações, os extensores rurais da entidade falam sobre a importância de reforçar a higiene durante as entregas. ”A gente tem orientado bastante eles no sentido de ter disponível conta em banco, para que o depósito ou transferência sejam feitos, assim não precisam manipular o dinheiro em espécie. Também temos orientado a higiene nas entregas. O uso do álcool em gel, lavar as mãos e também manter a distância na hora da entrega. Nos apartamentos, as pessoas tem que descer e pegar na calçada os produtos, a entrega é feita na calçada mesmo”, finalizou Luciana.