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A 2,5 mil quilômetros de distância de Itajá, no município de Lavras do Sul, no Rio Grande do Sul, um frigorífico que funciona com licença municipal abate 60 animais por mês. Na sala de abates, ninguém segue as regras sanitárias. Bois e suínos são mortos ao mesmo tempo, o que favorece a contaminação. Vísceras e resíduos não são tratados. E o pior, servem de alimento para porcos que estão num chiqueiro a poucos metros do local.
Para o neurologista Leandro Teles, os dois locais representam um grande perigo de contaminação para o ser humano.
– É falta de preparo, é falta de higiene, falta de condições, então a gente percebe que tem a saúde em risco. A carne é um alimento muito nutritivo, tanto para o ser humano, como para bactérias, fungos. Então é importante você seguir normas. Tem que ser fiscalizado, acompanhado todo o trabalho da carne, tanto no óbito do boi, até a mesa do consumidor – diz o especialista.
As consequências podem ser desastrosas para a saúde. Comer carne contaminada é um risco perigoso demais para se ficar exposto. Nos últimos cinco anos, 81 mil pessoas foram internadas pelo Sistema Único de Saúde com doenças relacionadas ao consumo de carne. O gasto para os cofres públicos foi de R$ 32 milhões.
O neurologista explica que existem dois tipos de contaminação. O primeiro caso é aquele em que o animal já está doente e tem a carne consumida pelo ser humano. O risco aumenta se a carne estiver mal passada. Entre as doenças mais comuns, estão a toxoplamose, brucelose, tuberculose e uma das mais perigosas, a cisticercose.
– A pessoa que consome uma carne mal passada, que tem cisticerco, forma larval, quando a pessoa engole esta larva ela pode ter dentro do seu abdômen a tênia, parasita que causa dor abdominal, diarréia, anemia. Quando a pessoa é contaminada com os ovos da tênia, ela é contaminada com a larva no cérebro e outros órgãos. Isso pode causar epilepsia, distúrbios de cognição, meningite, inclusive o óbito – afirma o neurologista.
Como se não bastassem os danos à saúde, os frigoríficos ainda provocam prejuízos ao meio-ambiente. Em Tatuí, no interior paulista, a lagoa de tratamento está condenada. Em Ouroeste, no atadouro municipal, água e sangue se misturam.
– Você joga o sangue no rio e, junto com o sangue, certamente aparecem algumas vísceras que vão juntas. Os animais que comem estas vísceras se transformam em vetores de transmissões de doenças – afirma o especialista em meio-ambiente Eduardo Assad.
Em Goiás, no abatedouro São José, na cidade de São Simão, o impacto ambiental é grande.
– Não precisa ser especialista em meio ambiente para dizer que nós estamos vendo um processo de contaminação coletiva na cidade, com riscos altíssimos de doença – afirma Assad.
A produção do Canal Rural entrou em contato com todas as prefeituras responsáveis pela fiscalização nos abatedouros mostrados nas imagens cedidas pela ONG Amigos da Terra. O secretário municipal de Itajá, em Goiás, disse que o dono do abatedouro Nova Era fechou o estabelecimento por conta própria e que não há mais abatedouros na cidade.
Jocimar Beloco, veterinário responsável pela fiscalização no abatedouro de Ouroeste, no interior de São Paulo, informou que, atualmente, os resíduos dos abates vão direto para uma rede de tratamento da Sabesp e da Cetesb. Beloco admitiu que há irregularidades e informa que está adequando o abatedouro às normas exigidas por lei. As prefeituras de São Simão, em Goiás, e Lavras do Sul, no Rio Grande do Sul, não responderam ao contato da reportagem.
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