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Qualidade das pastagens deve piorar com mudança climática, indica pesquisa

A temperatura média pode subir 2ºC nas próximas décadas e isso pode diminuir o teor de proteína do pasto; pecuarista vai sentir no bolso os reflexos

bois em pastagens
Foto: Fernando Carvalho/arquivo pessoal

O aumento das temperaturas médias esperado para as próximas décadas, de no mínimo 2ºC, pode ter um impacto inesperado no bolso dos pecuaristas, alertam pesquisadores. Estudos sugerem que um dos efeitos da mudança no clima será a redução na qualidade da pastagem, que se tornará menos proteica, mais fibrosa e, portanto, de digestão mais demorada. Como consequência, o gado precisará consumir mais alimento para alcançar o peso de abate e passará a produzir mais metano, um potente gás causador do efeito estufa.

As conclusões têm como base experimentos feitos pela equipe de Carlos Alberto Martinez y Huaman, professor do Departamento de Biologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP), da Universidade de São Paulo (USP). Participaram do estudo pesquisadores do Instituto de Botânica de São Paulo, da Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Jaboticabal e do Instituto Federal Goiano, campus Rio Verde.

Na tentativa de determinar com precisão as mudanças fisiológicas que as forrageiras deverão sofrer no futuro, Martinez evitou realizar experimentos em estufas. Segundo o pesquisador, as plantas cultivadas em vaso têm o crescimento das raízes limitado em relação ao comprimento que alcançam em campo aberto.

Outras variáveis impossíveis de serem reproduzidas em estufa são a intensidade e a variação da luminosidade e da temperatura, causadas pela ação do vento sobre as folhas, além da profundidade do solo, no qual as raízes podem penetrar à procura de água. “Para alguns experimentos, o modelo de vasos é válido, mas para simulações de clima futuro também são necessários experimentos de campo. Conseguimos aquecer as plantas ao ar livre com aquecedores infravermelhos. Além disso, enriquecemos o ar com CO2 em ambiente aberto, graças a uma infraestrutura denominada Trop-T-FACE”, conta Martinez.

O experimento

A espécie empregada foi o capim-mombaça (Panicum maximum), uma forrageira tropical de origem africana. Amplamente usado no Brasil como pasto, por sua alta qualidade nutricional.

“Colocamos aquecedores infravermelhos em 16 canteiros, aquecendo as plantas 2ºC acima da temperatura ambiente. Os equipamentos são capazes de detectar a temperatura ambiente a cada 15 segundos, ajustando os valores de acordo com a necessidade”, diz Eduardo Habermann, bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Nova call to action

De acordo com Habermann, o experimento foi realizado em novembro de 2016, período de grande calor. A temperatura ambiente estava em 38ºC e, nos canteiros, chegou a 40ºC. Ao longo do experimento, os pesquisadores aferiram as condições de trocas gasosas das plantas com a atmosfera, as condições da fotossíntese, a fluorescência da clorofila, a produção de folhagem (biomassa) e a qualidade nutricional do pasto.

“Vimos que, em condições de seca, as plantas tentam economizar a água do solo. O controle é feito pelos estômatos, pequenas estruturas presentes nas folhas, que se abrem para absorver o CO2. Mas, ao fazê-lo, perdem água. Com pouca água no solo, a raiz se ressente. A planta fecha os estômatos e transpira menos. O efeito da economia de água é a redução da fotossíntese, com a consequente piora na qualidade da planta”, diz Habermann.

Folhas mais fibrosas

Outras respostas do capim-mombaça ao estresse hídrico, detectadas pelo estudo, foram o aumento na quantidade de fibras das folhas e a redução no teor de proteína bruta – fatores que representam perda de qualidade nutricional.

Os pesquisadores estimam que, nas condições futuras de temperatura, o aumento na quantidade de fibras resultará em uma digestão mais difícil e demorada para o gado. A consequência direta será a produção de maior quantidade de metano pelos animais.

“O gado precisará consumir mais pasto até atingir o peso de abate. Para manter o mesmo nível de produção, os pecuaristas precisarão complementar a alimentação do plantel e regar as pastagens, com impacto significativo nos custos de produção”, alerta Martinez.

Outra alternativa, nem sempre possível, é a expansão das áreas de pastagem, o que pode favorecer o desmatamento ou fazer com que o produtor abra mão de outros cultivos.

A equipe também realizou experimentos como a leguminosa estilosantes campo grande (uma mistura das espécies Stylosanthes capitata e Stylosanthes macrocephala), forrageira rica em proteína e que executa a função de capturar o nitrogênio da atmosfera e fixá-lo biologicamente no solo, reduzindo os investimentos em insumos agrícolas, contribuindo para a redução dos impactos ambientais e possibilitando maior ganho de peso aos animais. “Os experimentos de mudanças climáticas realizados com deram o mesmo resultado. A qualidade nutricional é reduzida”, finaliza Martinez.

Você pode acessar as pesquisas mencionadas na reportagem aqui e aqui. As duas estão em inglês.