Dos 56 deputados federais do PT, 22 aparecem como autores de uma proposta que defende a criação de mais um imposto sobre a exportação de grãos e carnes. Trata-se do projeto de lei (PL) 1.586/22, apresentado na Câmara originalmente em junho.
O recesso parlamentar chegou ao fim na última segunda-feira (1º). Com isso, deputados federais e senadores retornaram às atividades de, entre outras ações, apresentar e analisar propostas — inclusive questões relacionadas ao agronegócio brasileiro.
Na volta aos trabalhos, a Câmara já aprovou, por exemplo, a urgência em projeto de incentivo à pecuária leiteira. Textos sobre defensivos agrícolas, regularização fundiária e licenciamento ambiental também estão em tramitação no Congresso Nacional.
Esses, porém, não são os únicos temas voltados à agricultura e à pecuária que podem ter a atenção do Poder Legislativo federal no decorrer deste segundo semestre. Parte da bancada petista na Câmara dos Deputados defende uma proposta que, se aprovada, poderia aumentar — ainda mais — os custos de produção de quem se dedica ao cultivo de grãos e à pecuária.
Dos 56 deputados federais do PT, 22 aparecem como autores do o grupo defende taxar a exportação de grãos e carnes quando houver o que eles próprios classificam como “ameaça ao abastecimento interno”.
Qual tipo de exportação de grãos e carnes seria afetada?
Em relação ao imposto extra sobre grãos a serem embarcados para o exterior, o projeto limita que ele só ocorreria em três tipos de produtos: arroz, milho e soja. A ideia dos autores do PL é que o tributo extra surja quando os estoques estiverem abaixo de 10% “das previsões dos volumes do consumo nacional”.
O material não menciona, contudo, qual seria o órgão de referência para tal classificação. Também não há definições sobre os valores a serem cobrados.
O projeto de lei não cita, assim como no caso dos grãos, o valor a ser taxado sobre a exportação de carnes. Defende-se apenas que a cobrança deve ocorrer em “situações de ameaças à regularidade do abastecimento interno”, conforme afirmam os 22 deputados federais do PT responsáveis pela proposta.
A ideia deles é, sobretudo, alterar o Decreto-Lei 1.578/77, que trata justamente de imposto de exportação. Essa cobrança extra seria direcionada, nesse caso, às carnes bovinas, suínas e de frango.
Deputados federais do PT criticam política de exportação de alimentos
“Contradição que afronta o interesse público no Brasil”, “abusividade dos volumes de alimentos exportados”, “exportações excessivas” e “compulsão exportadora” são algumas das frases usadas no projeto apresentado à Câmara por deputados federais do PT.
Para o avanço dessa ideia, os autores afirmam que outros países adotaram medidas até mais drásticas, como restringir — ou até mesmo proibir — a exportação de determinados alimentos desde a deflagração da guerra entre Rússia e Ucrânia, em fevereiro deste ano.
“[É preciso suprir] as demandas por alimentos por parte da nossa população”
“É relevante que até ampliemos a presença do Brasil no mercado global de alimentos numa quadra histórica de enormes desafios para a segurança alimentar no mundo, mas desde que satisfeitas, em primeiro lugar, as demandas por alimentos por parte da nossa população”, afirmam os responsáveis pelo o projeto.
O texto do PL acusa — sem apresentação de dados — o agronegócio brasileiro de investir no mercado internacional a partir de “subvenções públicas bilionárias para o setor”.
Abaixo, a íntegra do texto do PL 1.586/2022:
Os autores do projeto para taxar a exportação de grãos e carnes
Os 22 deputados federais do PT que aparecem como autores do projeto de lei para taxar a exportação de grãos e carnes são os seguintes*:
- Airton Faleiro – Pará;
- Afonso Florence – Bahia;
- Beto Faro – Pará;
- Bohn Gass – Rio Grande do Sul;
- Carlos Veras – Pernambuco;
- Célio Moura – Tocantins;
- Erika Kokay – Distrito Federal;
- Frei Anastácio – Paraíba;
- João Daniel – Sergipe;
- Leonardo Monteiro – Minas Gerais;
- Marcon – Rio Grande do Sul;
- Natália Bonavides – Rio Grande do Norte;
- Nilto Tatto – São Paulo;
- Padre João – Minas Gerais;
- Paulo Teixeira – São Paulo;
- Patrus Ananias – Minas Gerais;
- Paulão – Alagoas;
- Pedro Uczai – Rio Grande do Sul;
- Rogério Correia – Minas Gerais;
- Valmir Assunção – Bahia;
- Zé Carlos – Maranhão;
- Zé Neto – Bahia.
*Como consta no próprio texto, dos 22, 14 assinaram digitalmente o projeto.
Como está o andamento do projeto na Câmara?
O PL defendido por deputados federais do PT para taxar a exportação de grãos e carnes poderá ser encaminhado para o Senado Federal sem sequer ir à votação no plenário da Câmara dos Deputados.
É que a proposta foi apresentada como de “apreciação conclusiva”. Assim, se não houver contestação legal, o texto irá direto para a outra casa legislativa após passar por quatro comissões.
Apresentado à mesa diretora da Câmara dos Deputados em 10 de junho, o projeto terá de passar — antes de pensar em tramitar junto aos senadores — pelas seguintes comissões:
- Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural;
- Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços;
- Finanças e Tributação;
- Constituição e Justiça e de Cidadania.
A primeira parada é a comissão de agricultura, que recebeu o texto antes da pausa para o recesso parlamentar: 23 de junho. Após mais de um mês, o colegiado ainda não analisou o tema — e nem indicou publicamente quando deverá dar prosseguimento.
Frente Parlamentar da Agropecuária desaprova ideia de petistas
Apesar de estar parado em uma comissão da Câmara, alguns congressistas se movimentam para barrar o projeto defendido por deputados federais do PT para taxar a exportação de grãos e carnes. Presidida pelo deputado Sérgio Souza, do MDB do Paraná, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) rechaça veementemente o teor do conteúdo do projeto de lei.
De acordo com nota divulgada pela entidade ainda em junho, a avaliação do grupo petista é “equivocada”.
“O Brasil evita a utilização do imposto de exportação, em razão de seus efeitos negativos” — FPA
Colocando-se publicamente contrária a “qualquer taxação às exportações”, a FPA pontuou, ainda, que leis nesse sentido podem, no fim das contas, ter efeito maléfico para o país. “Vale salientar que, de acordo com informações do Ministério da Economia, como regra, o Brasil evita a utilização do imposto de exportação, em razão de seus efeitos negativos sobre eficiência econômica, estrutura de incentivos, alocação de recursos e desempenho exportador.”
Abaixo, a íntegra da nota da FPA sobre o projeto de deputados do PT para taxar a exportação de grãos e carnes:
A Frente Parlamentar da Agropecuária é contra qualquer taxação às exportações. A avaliação de que as vendas externas seriam mais importantes do que o abastecimento do país é equivocada, pois a maior parte da produção sempre se destinou ao mercado interno. Cabe destacar ainda que as exportações são fundamentais para escoamento da produção e para a regulação do mercado. Acreditamos que a proposta irá onerar e desestimular o setor.
A título de exemplo, em 2019, a produção de carne bovina destinou 77,3% ao mercado interno e apenas 22,3% foi exportado. Em relação ao mercado de aves, em 2021, 68% da produção se destinou ao mercado interno e no mesmo ano, quanto aos suínos, 76% da produção foi comercializada dentro do país. (Fonte: USDA/Scot Consultoria)
Vale salientar que, de acordo com informações do Ministério da Economia, como regra, o Brasil evita a utilização do Imposto de Exportação, em razão de seus efeitos negativos sobre eficiência econômica, estrutura de incentivos, alocação de recursos e desempenho exportador.
Por fim, a problemática apontada não decorre dos níveis de exportação, mas de múltiplos fatores, como o cenário pós-pandêmico, o aumento do dólar, o desabastecimento de insumos e aumentos dos custos de produção e perdas de safras decorrentes de fatores climáticos.
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