Os produtores catarinenses estão mais adiantados e conquistaram, em outubro de 2008, o reconhecimento oficial da raça crioula lageana por parte do governo brasileiro. Na portaria 1.048 do Ministério da Agricultura, foi concedida à Associação Brasileira de Criadores da Raça Crioula Lageana (ABCCL) a autorização para os trabalhos de registro genealógico dos animais da raça em todo o território nacional.
Atualmente, a entidade, com sede em Lages, conta com 27 associados e aproximadamente três mil animais em Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Distrito Federal. O rebanho catarinense está concentrado entre a Serra e o Oeste e responde por 80% do total.
Esses animais dominaram o campo nativo do Sul até o início do século 20, quando começaram a ser introduzidas as primeiras raças europeias no país. A partir de então, o material genético foi preservado por criadores de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul. Nos anos 2000, no entanto, a denominação do gado crioulo do Sul motivou uma queda de braço entre pecuaristas dos dois Estados.
O lageano Nelson Camargo, 81 anos, é o maior criador da raça no país, com 250 animais. Como herança da família, ele cria gado crioulo lageano desde 1953 e, ao lado de outros criadores como o veterinário Edison Martins, fundou a ABCCL, que hoje quer construir uma cadeia mercadológica para a utilização de todos os recursos dos animais, como a carne, a pele e os chifres.
Gaúchos fizeram parte da associação
Nelson Camargo e Edison Martins contam que, quando a ABCCL foi fundada, os criadores do Rio Grande do Sul foram convidados e, inclusive, participaram da entidade por algum tempo. Só que poucos meses depois, não concordando com a denominação lageana, os gaúchos saíram do grupo e fundaram a Associação Brasileira dos Criadores de Bovinos Franqueiros (ABCBF), sediada em Gramado (RS).
A separação fez com que o mesmo gado ficasse com dois nomes e, diante da ausência de registro oficial, os gaúchos chegaram a ser impedidos de participar com o gado franqueiro da Expointer, maior evento agropecuário do Brasil, que termina neste domingo, em Esteio (RS).
? O gado criado no Rio Grande do Sul não tem nada de franqueiro, e sim de lageano. Afinal, o franqueiro, que era de Franca (SP), já está extinto há anos. O franqueiro também é chifrudo, como o gado lageano, mas é distante geneticamente ? diz Nelson.
A organização da Expointer voltou atrás e, em reconhecimento à importância histórica do gado criado no Rio Grande do Sul, permitiu que os criadores os expusessem no evento, só que sem participação nos concursos. Contra a vontade dos lageanos.
? É preciso cumprir a portaria ministerial. Os criadores gaúchos não precisam ser associados a nós para obterem o registro. Podemos inspecionar e registrar os animais deles. Ocorre que eles estão nos causando prejuízos, pois estão usando um nome falso no gado. Isso pode provocar a deturpação da opinião pública e a depreciação da nossa raça ? avalia Edison, que também é diretor da associação lageana.
Contra o rótulo “lageano”
Fundada em 2006, a Associação Brasileira dos Criadores de Bovinos Franqueiros (ABCBF) conta com 11 criadores e um rebanho de 200 animais em oito municípios do RS.
O presidente da entidade, Sebastião Fonseca de Oliveira, 63 anos, diz que sua família cria a raça há mais de dois séculos e sempre com a denominação franqueiro. Sebastião contesta a informação dos criadores catarinenses, de que o gado franqueiro é de Franca (SP) e já estaria extinto.
? O nome original é franqueiro, que vem do castelhano e significa franco, livre, sem dono, sem marca. Ao chamarem de crioulo lageano estão passando por cima de uma denominação histórica ? reclama.
Oliveira reconhece que o gado franqueiro não tem registro oficial junto ao Ministério da Agricultura. Mas diz que os criadores do Rio Grande do Sul buscam o reconhecimento para a nomenclatura que eles entendem ser a correta.
? Chegamos a sugerir que seja tudo crioulo, mas não lageano. Esse gado está, de fato, há muitos e muitos anos em Lages. Mas não é de Lages, e não aceitamos chamá-lo de lageano.