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Leite

Vacas 'bravas' emitem mais metano e produzem menos leite, diz Embrapa

Animais de temperamento difícil de controlar emitem 40% a mais de metano entérico por quilo de leite, quando comparado às vacas mais calmas

O temperamento interfere no metabolismo da vaca, influenciando a emissão do gás metano entérico, um dos principais causadores do efeito estufa. Essa é a conclusão de uma pesquisa da Embrapa Gado de Leite (MG) em parceria com o Departamento de Zoologia do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Além disso, a estudo demonstra que vacas cujo temperamento é mais reativo à presença humana e à ordenha, produzem menos leite.

Segundo as pesquisadoras que conduziram o trabalho, mudanças climáticas e produtividade tornaram-se dois grandes argumentos para a adoção do manejo racional, prática que começa a ser utilizada com sucesso entre produtores com vacas das raças gir leiteiro e girolando em seus rebanhos. “Outro argumento já conhecido na prática pelos produtores que adotam a técnica é a melhora no manejo dos animais, facilitando o trabalho de condução do gado, evitando acidentes e o descarte das vacas mais reativas”, relata a pesquisadora da Embrapa Mariana Campos, que coordenou a pesquisa no Complexo Multiusuário de Bioeficiência e Sustentabilidade da Pecuária, na Embrapa em Coronel Pacheco (MG).

A preocupação com a emissão de gases de efeito estufa e o aquecimento global vem se destacando como uma preocupação ainda mais premente do setor. As pesquisas da Embrapa e da UFJF mostram que os bovinos leiteiros mais reativos chegam a emitir quase 40% a mais de metano entérico por quilo de leite, quando comparado às vacas mais calmas. Os experimentos que levaram a essa conclusão são parte da tese de doutorado em Biodiversidade e Conservação da Natureza de Maria Guilhermina Pedroza. Ela explica que os trabalhos foram feitos com 28 vacas girolando (F1) de primeira cria.

Todos os animais foram submetidos ao treinamento para a ordenha no período pré-parto e observados tanto no curral quanto na ordenha. “Analisamos o temperamento de cada indivíduo, identificando os mais calmos e os mais reativos através de comportamentos como passos, coices e a ocorrência de defecação e micção durante o processo de ordenha e no curral de manejo por meio indicadores como a agitação dos animais no tronco de contenção, a velocidade de saída dos animais do tronco e velocidade de fuga em relação a um observador desconhecido”, explica a doutoranda.

A produção de leite também foi medida e, ao se realizar ensaios de digestibilidade e respirometria (em câmaras respirométricas), verificou-se que as mais reativas destinaram 25,24% menos energia líquida para a lactação, enquanto as mais calmas, que ruminam mais na sala de ordenha alocaram 57,93% mais energia líquida para a produção de leite.

Mariana Campos diz que o experimento é importante para a pecuária de leite brasileira devido à importância da raça girolando para a produção nacional. O girolando é uma raça sintética desenvolvida para as condições tropicais, unindo duas raças de temperamentos diferentes: gir leiteiro e holandês. “O resultado do cruzamento dessas raças trouxe como consequência, um animal rústico e com boa produção de leite; no entanto, são mais ariscos à ordenha. O treinamento de novilhas para a primeira ordenha é uma técnica bastante adequada aos rebanhos de leite no Brasil devido à utilização de animais mestiços ou zebuínos.

A professora Aline Sant’Anna, coordenadora do Núcleo de Pesquisa em Etologia e Bem-estar Animal (Nebea) da UFJF, que orientou Maria Guilhermina na tese, conta que o temperamento dos animais possui um componente herdável, mas as condições ambientais também interferem no caráter das vacas. Embora os programas de melhoramento genético bovino tenham obtido conquistas nesse aspecto, o manejo racional, aliado a um ambiente calmo no momento da ordenha, deve ser adotado. “Embora o genoma influencie o caráter do animal, é possível moldar o fenótipo através de um ambiente adequado”, pondera a professora. A seleção de vacas mais calmas e a adoção de boas práticas de manejo favorecem o bem-estar tanto das vacas quanto dos trabalhadores.

No momento em que as empresas do setor lácteo estão trabalhando para neutralizar as emissões de carbono do setor, a pesquisa comprova que a adoção de protocolos de doma racional e o melhoramento animal focado na busca por animais mais dóceis podem ser importantes estratégias para que as metas de descarbonização sejam atingidas. “Animais com temperamento mais reativo são indesejáveis para uma pecuária eficiente e sustentável,” conclui Campos.

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