O diretor-geral da agência da Organização das Nações Unidas (ONU) para agricultura e alimentação (FAO), José Graziano da Silva, garantiu que a entidade não tem planos de recomendar que as pessoas reduzam o consumo de carnes. Há dez dias, o ministro da Agricultura do Brasil, Blairo Maggi, foi a Roma e avisou, durante conferência da FAO, que o Brasil não aceitaria uma sinalização do órgão nesse sentido.
“Entendemos que a FAO, no cumprimento do seu mandato, deve priorizar questões relativas à produção de alimentos, à produtividade e à nutrição. Nesse contexto, alimentos de alto valor proteico, como a carne bovina, devem ser reconhecidos. Recomendações sobre diminuição do consumo de carne bovina, devido a emissões, não devem ser feitas”, afirmou Maggi na ocasião.
Em Genebra, Graziano foi enfático. “Isso é uma invenção que não sei de onde surgiu”, afirmou. “Nunca recomendamos reduzir o consumo de carnes. Há uma preocupação em diversificar o consumo de proteínas. É fortemente recomendável aumentar o consumo de proteínas de origem vegetal e, entre as proteínas animais, a recomendação é elevar o consumo de peixe, por ser mais saudável e de mais fácil digestão”.
José Graziano não soube explicar a postura de Blairo Maggi. “Tem que perguntar para o ministro. Ele foi a Roma se encontrar comigo na conferência da FAO. Se ele tinha outras intenções, tem que perguntar a ele”.
Para o diretor-geral da FAO, a confusão pode ter sido causado porque há 20 anos um analista destacou num estudo da FAO o elevado volume de água necessário para a produção de um quilo de carne e, portanto, o impacto da atividade para o ambiente. “Mas esse número nunca foi reavaliado, a FAO não o utiliza e nem temos recomendação sobre isso”.
Em relatório sobre as perspectivas agrícolas para o período 2017-2026, a FAO e a OCDE estimam que o espaço para uma ampliação expressiva do consumo global de carnes é limitado, em virtude de recentes tendências de dieta, baixa renda e restrições de oferta.
Conforme Graziano, a queda do consumo de carnes no mundo está sendo particularmente influenciada pelo menor ritmo de crescimento da demanda na China. “Esse é o grande problema do consumo mundial. Está se reduzindo o consumo de cereais e de carnes porque não há mais o ‘efeito China’ no mercado”.
O consumo de alimentos está em expansão, mas em ritmo menor, e em países em desenvolvimento como o Brasil a média já está próxima de 3 mil calorias per capita, que é o patamar dos países desenvolvidos, segundo o diretor-geral da agência da ONU. Um problema apontado pelo relatório de OCDE e FAO, lembra ele, é com o aumento da obesidade. E calorias e proteínas adicionais deverão vir principalmente de açúcar e óleo de palma.
De qualquer forma, a FAO é cada vez mais explícita na recomendação para que a população amplie o consumo de peixes. Graziano, em recente visita a Tóquio, apontou o Japão como um modelo global de dietas saudáveis, por causa do nível de consumo de peixes, frutas e legumes.
Na verdade, o ataque à carne normalmente costuma vir de outras organizações internacionais. Em 2010, um relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio-Ambiente (UNPE) sugeriu a redução do consumo de produtos de origem animal para mitigar os impactos da mudança climática.
Em 2015, a Agência Internacional para Pesquisa de Câncer, vinculada à Organização Mundial da Saúde (OMS), colocou a carne vermelha no grupo “2A”, lista que inclui produtos com “provável cancerígeno para humanos”. E também incluiu bacon, presunto e salsicha na mesma categoria do cigarro.