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Piscicultura brasileira cresce 123% em dez anos

Entre as espécies de peixe, a tilápia e o tambaqui respondem por 62% da produção nacional 

Fonte: M. Hasan/FAO

Chegada de novas empresas, rápida profissionalização e intensificação tecnológica foram alguns dos fatores observados na aquicultura brasileira, que apresentou crescimento de 123% entre 2005 e 2015, passando de 257 mil para 574 mil toneladas de pescado nesse período. Foi o que mostrou estudo realizado pelos pesquisadores Manoel Pedroza, Andrea Muñoz, Roberto Flores e Eric Routledge, da Embrapa Pesca e Aquicultura (TO), e apresentado na conferência deste ano do International Institute of Fisheries Economics and Trade (IIFET), em Aberdeen, Escócia.

O trabalho chama a atenção porque o setor, dedicado à produção de seres aquáticos como peixes e crustáceos, costumava ser caracterizado no Brasil por empreendimentos de pequeno porte, sistemas extensivos de produção e baixo nível tecnológico, com exceção da produção de camarões no Nordeste, a carcinicultura.

Pedroza associa essas mudanças ao aumento da demanda por pescado no mercado nacional, que registrou taxas de crescimento anuais superiores a 10% no mesmo período. No entanto, o estudo detectou que a recente crise econômica nacional também repercutiu no crescimento do setor em 2015, o qual cresceu apenas 2% com relação a 2014, passando de 563 mil para 574 mil toneladas.

O bom desempenho da aquicultura brasileira despertou o interesse de importantes instituições financeiras como o banco holandês Rabobank, maior financiador mundial do setor agrícola. A instituição holandesa e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) consideram o Brasil um importante ator da aquicultura mundial, situando-o em patamar semelhante ao de países com tradição no setor como Chile, Vietnã e Noruega. Atualmente, o Brasil registra a 14ª maior produção aquícola do mundo de acordo com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e a Fome (FAO).

Investimentos

Os pesquisadores registraram a entrada de empreendimentos privados de maior porte na cadeia brasileira da aquicultura. O município de Selvíria (MS) recebeu um investimento de R$ 160 milhões em um complexo que incluiu fábrica de ração, alevinagem, engorda e processamento de tilápia. Em Tocantinópolis (TO), houve construção de fábrica de ração e viveiros de engorda para a cadeia de tambaqui e pintado, mesmas espécies produzidas em Sorriso (MT), município onde foram investidos R$ 22 milhões para a instalação de frigorífico e fábrica de ração para peixes. A cidade de Almas (TO), já conhecida como polo aquícola do estado, recebeu instalações para engorda e processamento de tambaqui, pintado, matrinxã, piau, curimba e pirarucu.

Pedroza destacou também a recente fusão de duas grandes empresas brasileiras de processamento de pescado, a Geneseas e a DellMare. Anunciada no último dia 18 de novembro, a nova companhia é vinculada a um fundo de investimento focado no agronegócio e produzirá 12 mil toneladas de tilápia por ano e três mil toneladas de camarão vannamei (Litopenaeus vannamei). “Esse é mais um sinal da força e maturidade desse setor no Brasil que começa a contar com grandes players a exemplo do que já ocorre com a cadeia produtiva da avicultura”, compara o especialista.

O estudo identificou também aumento no preço da ração e estabilização no preço do pescado no País no período analisado. “Caso o aumento da produção aquícola nacional continue no ritmo de 10% ao ano, é de se esperar que essa tendência de estabilização dos preços do pescado se mantenha, ao menos no curto e médio prazos”, acredita o pesquisador Manoel Pedroza, para quem o preço competitivo do produto importado representa uma forte pressão para manter o pescado brasileiro com preços competitivos.

Além dos investimentos privados, o aumento na escala de produção tem sido provocado também pela organização dos produtores. Os pesquisadores observaram a formação de organizações como cooperativas, associações e modelos produtivos alternativos como o condomínio de piscicultura, que dilui custos importantes.

Segundo dados do IBGE para o ano de 2015, a produção de peixes de água doce é a principal categoria dentro da aquicultura brasileira respondendo por 84% da produção aquícola do País. A aquicultura marinha responde por apenas 16% da produção total, sendo composta pela carcinicultura (12%) e pela produção de ostras, vieiras e mexilhões (4%).

Entre as espécies de peixe, a tilápia (Oreochromis niloticus) e o tambaqui (Colossoma macropomum) respondem por 62% da produção nacional, de acordo com dados coletados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2016).

Intensificação tecnológica

Os pesquisadores comparam o desenvolvimento da aquicultura ao que ocorreu na cadeia de produção da avicultura nacional, que elevou seu patamar tecnológico e hoje é uma das principais pautas da carteira de exportações do Brasil. O maior emprego tecnológico ocorreu, de acordo com a pesquisa, na cadeia produtiva do peixe mais produzido no Brasil, a tílápia, que responde por 38% da produção nacional. “Originária da África, a tilápia-do-nilo é produzida em vários países e possui pacote tecnológico bastante avançado”, conta a economista Andrea Muñoz, pesquisadora da Embrapa que participou do estudo.

Boa parte dessas informações foi obtida por meio de painéis nos principais polos produtores de tilápia no Brasil: Paraná, Ceará, Bahia, Pernambuco e Minas Gerais. Essas atividades foram realizadas no âmbito do Projeto Campo Futuro da Aquicultura, coordenado pela Embrapa Pesca e Aquicultura, que detectou a intensificação de tecnologias, como os aeradores em viveiros que permitem maior densidade de cultivo; o alimentador automático, que reduz custos de mão de obra e aumenta a precisão na dosagem de rações e a despesca automática.

Outra tecnologia encontrada pelo projeto foi o emprego de programas de melhoramento genético da tilápia, que permitiu avanços de conversão alimentar a qual diz respeito à relação de ganho de peso com a quantidade de ração consumida. O melhoramento também é capaz de reduzir o ciclo de produção e proporcionar animais com maior rendimento de filé.

“Por se tratar de uma espécie exótica produzida há décadas em diversos países, e cujo pacote tecnológico está relativamente bem desenvolvido, a tilápia apresenta indicadores zootécnicos bem superiores comparados aos do tambaqui, que ainda conta com um nível tecnológico limitado,” diz a pesquisadora.

O trabalho mostra que a biodiversidade da fauna aquática brasileira é, ao mesmo tempo, vantagem competitiva e gargalo ao desenvolvimento para a inovação tecnológica. “Isso acontece porque cada espécie de peixe apresenta diferentes demandas, o que leva à priorização de poucas espécies a serem desenvolvidas. Essa característica é encontrada em grandes países piscicultores como Noruega, Chile, China e Vietnã”, esclarece o pesquisador Manoel Pedroza.

Outro grande desafio para a pesquisa aquícola no Brasil é desenvolver soluções que abordem a diversidade climática encontrada nos cultivos, uma vez que a piscicultura é praticada em todos os estados brasileiros.

O estudo considera ainda o pirarucu (Arapaima gigas) uma das mais promissoras espécies de peixe do Brasil. Apesar de ser muito apreciado e apresentar bom rendimento, os pesquisadores lembram que há grandes desafios que comprometem a estruturação de sua cadeia produtiva. Entre os obstáculos mais críticos, está o baixo domínio de sua reprodução em cativeiro e a oferta irregular de alevinos (animal jovem), o que faz o preço desse insumo representar quase 25% do custo operacional efetivo da atividade. Em uma comparação, alevinos de tambaqui representam apenas 1,6% desse mesmo custo.

“Quando os desafios tecnológicos relacionados à reprodução forem superados, consequentemente haverá maior disponibilidade de alevinos e o custo desse insumo cairá, melhorando a viabilidade econômica do cultivo do pirarucu”, acredita Pedroza.

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