Serviços de polinização representam 10% do valor da produção agrícola mundial

Aluguel de uma colônia de abelhas para fazer a polinização chega a US$ 200 nos Estados Unidos; população de abelhas está em diminuição no mundoA humanidade tem explorado colônias de abelhas produtoras de mel desde a pré-história, mas somente nos últimos anos se deu conta de que a importância desses insetos para a sua alimentação vai muito além da fabricação do poderoso adoçante natural.

– O mel é, na verdade, um subproduto pequeno quando comparado ao valor do serviço de polinização prestado pelas abelhas, que corresponde a quase 10% do valor da produção agrícola mundial – diz a professora da Universidade de São Paulo (USP) Vera Lúcia Imperatriz Fonseca.

Cientistas estimam que no ano de 2007, por exemplo, o valor global do mel exportado tenha sido de US$ 1,5 bilhão. Já o valor dos serviços ecossistêmicos de polinização em todo o mundo era calculado em US$ 212 bilhões. Os dados foram levantados em diversos estudos e estão reunidos no livro Polinizadores no Brasil: contribuição e perspectivas para a biodiversidade, uso sustentável, conservação e serviços ambientais, um dos vencedores do Prêmio Jabuti de 2013.

A obra é fruto do Projeto Temático da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) Biodiversidade e uso sustentável de polinizadores, com ênfase em abelhas Meliponini, coordenado por Fonseca no âmbito do Programa de Pesquisas em Caracterização, Conservação, Recuperação e Uso Sustentável da Biodiversidade de São Paulo (BIOTA).

As verduras e frutas lideram as categorias de alimentos que necessitam de insetos para polinização; cada uma das produções tem valor estimado de 50 bilhões de euros). Em seguida vem as culturas oleaginosas, estimulantes (café e chá), amêndoas e especiarias. Em média, segundo os estudos, o valor das culturas que não dependem da polinização por insetos é de 151 bilhões de euros por ano, enquanto o das que dependem da polinização é de 761 bilhões de euros.

– Cerca de 75% da alimentação humana depende direta ou indiretamente de plantas polinizadas ou beneficiadas pela polinização animal. Dessas, 35% dependem exclusivamente de polinizadores. Nos demais casos, insetos como as abelhas ajudam a aumentar a produtividade e a qualidade dos frutos – afirma Fonseca, que atualmente é professora visitante na Universidade Federal Rural do Semiárido (Ufersa), no Rio Grande do Norte.

Pesquisas recentes, conta Fonseca, mostraram que mesmo culturas como a canola (polinizadas pelo vento) e a soja (considerada autofértil) produzem entre 20% e 40% a mais por hectare quando recebem apoio de colônias de abelhas da espécie Apis mellifera ou quando a plantação é feita ao lado de áreas com remanescentes de vegetação nativa.

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– Quando se usam abelhas, jataí por exemplo, na polinização do morangueiro em ambientes protegidos, diminui em 70% o número de frutos malformados em alguns cultivares. Outra cultura que se beneficia da polinização em ambientes protegidos é a do tomateiro, que precisa de abelhas que vibram nas flores, como as do gênero Melipona. Em geral, as abelhas aumentam a produção de sementes, atuam na qualidade do habitat, tornam os sistemas agrícolas mais sustentáveis e trazem benefícios amplos ao meio, favorecendo outros serviços ecossistêmicos que permitem a preservação da biodiversidade e dos recursos hídricos – disse Fonseca.

Um estudo desenvolvido no Departamento de Economia Rural da Universidade Federal de Viçosa estimou que, em uma área de 2,3 hectares de cultivos de maracujá, os serviços prestados por abelhas mamangavas (Xylocopa) diminuem os custos de produção em torno de R$ 33 mil reais por hectare a cada três anos. Mas, apesar de sua importância, as mamangavas são muitas vezes mortas pelos produtores por serem consideradas agressivas, contou Silva.

Abelhas ameaçadas

Embora a demanda pelos serviços de polinização das abelhas cresça na mesma medida em que cresce a produção agrícola mundial, os habitats favoráveis à manutenção desses insetos diminuem a cada ano. Tal descompasso tem resultado em um fenômeno recente batizado pelos cientistas como desordem do colapso das colônias (CCD, na sigla em inglês).

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De acordo com Fonseca, a síndrome do desaparecimento das abelhas foi detectada pela primeira vez em 2007 no Hemisfério Norte. Atualmente, naquela região, a perda tem sido em torno de 30% das colônias por ano e tem se tornado necessário importar abelhas de outros locais para promover a polinização agrícola. A Europa também sofre com o fenômeno, que começou a ser detectado no Brasil em 2011.

– O aluguel de uma colônia de abelhas para fazer a polinização chega a US$ 200 nos Estados Unidos, pois os produtores sabem que o lucro gerado pelo serviço prestado será muito maior. E não há abelhas suficientes. Esta é uma tendência mundial, pois cada vez mais plantamos culturas que dependem das abelhas para sua produção – contou Fonseca.

Entre os fatores apontados como causa do desaparecimento das abelhas estão o uso inadequado de herbicidas e pesticidas, o desmatamento seguido pela ocupação do solo por extensas monoculturas e a migração de colônias para promover a polinização agrícola.

– O pesticida, quando não mata a abelha num primeiro momento, a deixa fraca e reduz o tempo da atividade forrageira (busca de alimento). Por outro lado, as abelhas têm de percorrer distâncias cada vez maiores em busca de comida quando ocorre a substituição da vegetação nativa por monocultura, pois há menor diversidade de flores. A migração de colônias, por sua vez, pode aumentar a competição por comida entre as espécies e favorecer a disseminação de doenças – explica Fonseca.