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Diversos

‘Queremos acabar com moratória da soja, mas também com a desconfiança do mercado’

Para o deputado federal Alceu Moreira, presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, o não cumprimento da moratória pode prejudicar toda a sojicultura brasileira, mas é preciso conhecer as exigências das trades para mudar isso

Para o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), Alceu Moreira, a moratória da soja é hoje uma exigência do mercado internacional que precisa ser cumprida. Mas, segundo ele, é preciso trabalhar para vencer a desconfiança do mercado sobre a sustentabilidade da produção nacional do grão, antes de tentar derrubar essa medida.

Em entrevista ao Canal Rural, o deputado também fala sobre a competitividade da agropecuária do Brasil no panorama mundial, as perspectivas para o setor e as prioridades da FPA em 2020.

Canal Rural – Como o senhor vê a moratória da soja?
Alceu Moreira – Ela tem dois ângulos. O primeiro é o da injustiça, de fazer com que o cidadão que plante soja tenha o prejuízo de vender o produto do mesmo preço com a mesma qualidade, tem que fazer uma gambiarra e tem que vender em nome de outro porque ele está na moratória. Só que passar a ideia de que o comprador brasileiro é o responsável por isso é muito complicado, porque é uma exigência do mercado internacional. A questão é que a soja da moratória está num volume, numa área com menos de 2% da área total, então precisa fazer cálculo de risco. Não importa quem tem razão, mas se não quisermos cumprir a moratória vamos prejudicar os outros 98% por causa dos 2%, isso é um cálculo que deve ser feito. Mas, enquanto isso não acontece, temos que trabalhar, precisamos sair do raio da desconfiança. Então precisamos ter clareza nisso. Temos que saber aqui das trades que estão com a moratória e saber quais são as exigências que devem ser feitas para acabar com a moratória. Nós queremos acabar com a moratória, mas junto com ela acabar com a desconfiança do mercado.

CR – Qual sua visão sobre a soja no agronegócio e as ações governamentais sobre o tema?
Moreira – A perspectiva de mercado não é para o ano que vem. Não há nada que possa acontecer no mundo, mesmo com a crescente produção africana, que a safra americana seja cheia… Mas com o consumo dos países asiáticos, com o consumo dos países árabes, a população muçulmana, a própria comunidade europeia, nós acabamos por não conseguir produzir os volumes que exigem o mercado. Eu não vejo nada na soja que seja problema. O problema não está lá fora, está aqui: é nós termos um produtor que fica produzindo sem renda. Isso sim é um problema. Levar para a lavoura da soja vários sócios ocultos. Uma inflação de 3,5% ao ano, durante quatro anos consecutivos, com a taxa Selic chegando a 4,5% e o juro chega a 17% do produtor e alguém chama de subsídio. Aí tem seguro, e não é seguro para a lavoura, é para alguém da família, e tem mais isso e aquilo… O que acaba encarecendo a lavoura, porque tem 34% de tributos da porteira para dentro. “Mas a lavoura é isenta”… Não é! O combustível é com ICMS, a telefonia, a energia, as peças do trator e todas as máquinas têm IPI, tudo isso está embutido na lavoura. Nos outros setores, a conta é débito e crédito, no nosso embute os 34% e fica com ele. Esse agronegócio precisa urgentemente reconstruir a tabela de custo de produção e não pode passar verniz nesse processo para não gerar endividamento. Tem a montanha de produção e fica aumentando o endividamento. A FPA no ano que vem vai trabalhar para que o produtor tenha renda. Nós temos que quebrar essa cadeia desses prédios gigantescos. Tem muito sócio oculto que está na lavoura, que sempre ganhou dinheiro com a lavoura e é extremamente desnecessário. Produtor tem que ter renda, sem renda não existe.

CR – Como vê o ano de 2019 para o agronegócio no Brasil?
Moreira – O ano de 2019 conclui com vários pontos positivos. Porque o governo que se instalou é um governo favorável a disrupção. Um país burocrático… um país que tinha vocação para trabalhar no mercado e que tinha um governo tentando de todas as formas arrastar o país para o socialismo. Tem um choque de funcionamento, o cidadão quer colocar um estado gigante e acaba interferindo no mercado competitivo. O governo Bolsonaro chegou, leva um tempo até começar a andar, mas agora assina uma portaria como a da regularização fundiária. Milhares de famílias terão as escrituras públicas de posse da sua terra. A pequena e a média propriedade ficaram abandonadas. Essa propriedade a partir da apresentação da escritura pública passa a ter crédito adequado, começa a produzir três vezes mais do que produz agora. Só para saber, 92% dos produtores tem menos do que três módulos. Essas pessoas que estão fora das políticas públicas não podem ter conectividade, não consegue semente da melhor qualidade, não tem logística da melhor qualidade. Estão no prejuízo do processo. Agora eles todos serão incluídos no processo.
Tudo indica que, com a MP 897, com a regularização fundiária, com a lei de competitividade, com a liberdade econômica, com todos os processos que vamos ter agora de desregulamentação dos empréstimos, cuidar do crédito. As pessoas fazem confusão com o crédito. O crédito, o que fica no meio entre o cidadão que empresta e o que toma. Não podemos ter um banqueiro robusto riquíssimo e um miserável devedor do outro. Temos que cuidar da natureza do crédito. Temos que ter segurança de recebimento. O risco que reduz o custo do crédito.

A FPA que presido tem uma capacidade junto com o IPA [Instituto Pensar Agro], inclusive com a CNA [Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil], que se associou conosco, de desenhar políticas públicas com legislação absolutamente focada e qualificada. Leis que serão trabalhadas por vírgula e sílaba. É impossível ter uma lei para agricultura mal feita. Se ela for para a Câmara, ela já vai pronta, porque é um instrumento legal, um instrumento de solução de vida pras pessoas.

CR – Como vê a comunicação entre o campo e a cidade?
Moreira – Fomos absolutamente competentes para construir essa agricultura fantástica. Da roça para a mesa, chegamos com muita competência. Temos diversidade, fartura geral, qualidade geral, todo mundo se beneficia com isso. Só que o cidadão sai da mesa e sai falando mal da agricultura. Então nós temos que mudar a comunicação da mesa para a roça. Isso tem jeito de fazer. É comunicar as pessoas que estão se alimentando, a rastreabilidade daquele produto, de onde veio.

CR – Qual sua opinião sobre a competitividade da agropecuária brasileira?
Moreira – Nós temos que saber que estamos nas regras de mercado. Vamos ter que discutir isso detalhadamente. Ou vocês acham que a carne brasileira não conseguiu ser vendida para os EUA como eles tinha prometido por acaso? É porque o produtor americano foi para cima do presidente e disseram: não permitam, o Brasil é um grande competidor nosso. Não entramos na OCDE por quê? Porque disseram exatamente: vão ajudar o nosso competidor? E nós vamos ficar queixosos com isso? Não. Vamos continuar persistindo com competência, eficácia e integridade e conquistar esse espaço internacional. Os mercados de modo geral, em dez anos, teremos 16 Brasis para alimentar. É o crescimento do mercado da Ásia, dos países árabes e a própria Europa. Em torno de 3,6 bilhões de pessoas. Ou muda a categoria de consumo: comia pé de galinha, classe média baixa, classe média come peito e ele vai para a alta e come bife. Todo ano eles sobem, estão indo pra classe média.

Então nós teremos que estar produzindo 600 milhões de toneladas de grãos, e nós vamos estar produzindo isso. Para que tudo isso aconteça, precisa cuidar muito bem da pesquisa, tecnologia e inovação. São fatores preponderantes. Precisamos tratar de sanidade animal. Não permitir, por exemplo, o terrorismo biológico. Pode chegar alguém aqui e colocar peste suína de propósito para nos deixar fora do mercado. Nós estamos numa competição de mercado. E por último, uma coisa importante, que é a assistência técnica e extensão rural. Esses são os fatores que garantem pro Brasil a capacidade do Brasil produzir três, quatro vezes mais do que produz hoje num mesmo espaço de solo.

Nós não precisamos ser simpático para governo algum, e nem o governo precisa. O governo quer alguém que dê sustentabilidade honesta, presidida, qualificada, produtiva, para que o país precise andar. Temos muita confiança que o país vai dar certo. Vamos crescer “1 e pouco” por cento neste ano, vamos crescer 2% a 3% no ano que vem, e logo depois vamos pegar um período de crescimento longo. E também para o consumo brasileiro, vai ser um período de muita renda.

CR – E para 2020, quais serão as prioridades do trabalho parlamentar?
Moreira – Tudo indica que já se abre 2020 com processo em que as instituições se conhecem. O governo Bolsonaro se instalando. Ele tinha uma regra de fazer sem influência partidária. Na minha visão, um acerto. Fez um ministério, que é muito competente, mas de pessoas desconhecidas. Pessoas que nunca jogaram junto. Chegaram com uma estrutura enorme, com o país cheio de problemas e vamos trabalhando isso. Essa equipe hoje é absolutamente conhecida e já tem uma capacidade produtiva enorme. O grau de cooperação e sintonia do governo Bolsonaro entre os ministérios é bastante elevado. O parlamento já descobriu que no governo Bolsonaro não adianta ficar olhando para o outro lado da rua. O que é atribuição do parlamento é ele que tem que fazer. Eles não fazem e não vêm aqui para fazer. Isso nos deu protagonismo, o deputado se sente muito mais autoridade hoje. Tem mais dever a cumprir. Isso é saudável para o país.

Temos alguns problemas com o Judiciário, principalmente, com o STF. Mas esperamos que isso passe. A sociedade brasileira está reconstruindo seu tecido de integridade. Ela não é tolerante a essa passação de [mão na] cabeça, perdãozinho… As pessoas não querem mais isso. Quem não compreendeu vai ter que compreender.

Mas minha expectativa para o ano que vem é que os times em vários setores, de maneira absoluta, estão absolutamente prontos para começar o ano com o pé no acelerador. Não tem ninguém com o pé no freio. Todo mundo sabe o que falta fazer, com expectativa, todo mundo concluindo suas agendas e tenho muito orgulho de fazer parte de um setor, o da agropecuária brasileira.

CR – Algum projeto terá mais atenção em 2020?
Moreira – Alguns deles já estão aí. Como a MP 897, relatada pelo Pedro Lupion. Reorganiza completamente a natureza do crédito. Cura o crédito. A nossa lei de conectividade vai botar R$ 20 bilhões. Vai ter banda larga, por exemplo, no Amazonas. O cidadão vai vender um peixe no cartão de crédito. Imagina o que significa isso na extensão rural. Estou criando cabra, num lugar longínquo do Nordeste e aí tem alguma coisa com minha cabra. Nós iremos fazer um questionamento da Emater informando ele para que possa agir dessa forma. Tenho problema com minha lavoura de coqueiros e o cara diz que deve ser isso ou aquilo. Essa extensão rural que tinha que abrir a porteira, entrar na casa, conversar e convencer a pessoa não precisa mais. Tendo conectividade por fibra óptica, por satélite ou por antena, se conseguirmos fazer isso chegar no Brasil inteiro, este país explode em produção e qualidade. Essa é nossa grande expectativa.

O Brasil ainda carece de segurança jurídica, ainda tem muitos fatores negativos, ainda tem muitas pessoas dentro do agro e ministério público ideologizados. Utilizando seus postos para fazer valer suas crendices ideológicas em vez de jogar a favor do país. Nós vamos ter que trabalhar e vencer isso. Mas os parlamentares estão prontos para essa luta, criando convergência, fazendo consenso, e construindo um país que se harmonize cada vez mais, mostrando para as pessoas por atitude, por resultado e não por palavras.

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