A febre é uma resposta importante para ajudar o organismo a combater infecções, mas tem um alto custo energético.
Por isso, mamíferos e aves podem reduzir a temperatura corporal, em vez de aumentá-la, quando as condições são desfavoráveis para induzir a febre.
O sistema imune entende que a infecção pode ser combatida posteriormente, quando a energia estiver sobrando.
Em artigo publicado no Journal of Experimental Biology, pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp) apoiados pela Fapesp, reforçaram a hipótese de que a hipotermia regulada é uma estratégia imunológica para tolerar infecções em aves.
A pesquisa foi destaque em texto de divulgação publicado na mesma revista.
Em um trabalho anterior, o grupo havia demonstrado que as aves também possuem esse mecanismo, até então descrito apenas em mamíferos.
Com isso, aventaram a possibilidade de que a capacidade de induzir hipotermia pode ter sido herdada de um ancestral distante e comum aos dois grupos de animais ou desenvolvida de forma independente.
“Desta vez, injetamos nos pintinhos uma alta dose de lipopolissacarídeo [LPS], um componente da parede bacteriana que simula uma infecção, mas não causa doença nos animais. Medimos como eles lidam com a suposta infecção em quatro diferentes cenários: aquecidos e bem alimentados; aquecidos e com fome; com frio e bem alimentados; e com frio e fome”, diz Lara do Amaral Silva, que realizou o trabalho durante seu doutorado na Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV-Unesp) de Jaboticabal, com bolsa da Fapesp.
Como esperado, os pintinhos bem alimentados e aquecidos começaram a desenvolver febre a partir de três horas após a injeção.
Já a temperatura dos que estavam com fome e frio teve uma queda aproximada de 2 ºC durante a primeira hora após a infecção, quando então passou a subir gradualmente.
Mesmo seis horas após a injeção de LPS , um período que não havia sido registrado no trabalho anterior do grupo, a temperatura dos animais estava º0,5 C mais baixa, num momento em que se esperaria observar febre.
Nos outros grupos experimentais, os resultados foram intermediários entre esses.
“Os pintinhos com fome e frio, quando infectados, estavam direcionando mais sangue para a pele e estavam ofegantes, permitindo que mais calor escapasse do corpo. Estavam claramente se mantendo frios, muito provavelmente para evitar gasto de energia, priorizando a manutenção das funções vitais em vez do combate da infecção”, explica Kênia Cardoso Bícego, professora da FCAV-Unesp e coordenadora do estudo.
Para verificar se os pintinhos desafiados com frio e fome ainda mantinham a capacidade de aumentar a taxa metabólica e produzir febre, os pesquisadores injetaram um medicamento que induz um aumento do metabolismo. Assim, as aves teriam energia de sobra para aumentar a temperatura.
Entretanto, mesmo com a droga em ação e a taxa metabólica aumentada, a temperatura do corpo não subiu. Os pintinhos buscaram perder calor, mostrando que a inibição da febre era regulada pelo organismo e não uma falha imunológica.
“Os resultados reforçam a ideia de que a queda de temperatura durante uma infecção severa não é um colapso do organismo, como já se argumentou. Pelo contrário: é uma resposta para conservar energia, evitando o aumento da temperatura, que é um gasto muito elevado. Além disso, a queda de temperatura é priorizada quando o animal tem outros desafios para enfrentar, como o frio e a fome”, encerra Bícego.