Os impactos da reforma tributária que tramita no Congresso para o setor agropecuário foram tema do programa Direto ao Ponto que foi ao ar neste domingo, 29. O programa teve a participação da advogada e consultora da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Patrícia Silva, e do advogado e consultor do Instituto Pensar Agropecuária (IPA), Eduardo Lourenço. Os modelos sugeridos pelas duas Propostas de Emenda à Constituição em discussão no parlamento são motivo de preocupação, principalmente, por parte de pequenos e médios produtores.
Essa apreensão ocorre porque as PECs 45 e 110 unificam impostos, criam o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e estipulam a tributação sobre o consumo. Isso significa que cada segmento da cadeia produtiva, após tributado, terá direito a um crédito para ser usado na próxima etapa de comercialização. No entanto, explica a consultora da Abag, esse processo não é tão simples pelas características do setor rural brasileiro. ”Para o agronegócio, nós temos alguns pequenos percalços porque as reformas tratam igualmente pessoas físicas e jurídicas. E, hoje, 98% dos produtores rurais são pessoas físicas”.
O consultor do IPA acrescenta que esse grupo majoritário de produtores pessoas físicas não têm a obrigatoriedade de ter o livro caixa eletrônico. A falta de formalização da contabilidade do agricultor brasileiro “gera uma dificuldade para saber o que ele pagou para o elo anterior”, esclarece. Com isso, Eduardo Lourenço alerta que esse modelo, em vez de simplificar, pode aumentar os custos para pequenos e médios produtores.
Lourenço lembra que está em discussão a implantação de um sistema que poderia simplificar o registro contábil de pessoas físicas. Mas, por enquanto, é uma apenas uma promessa. “A grande questão é: a gente vai conseguir ter um sistema que consiga fazer essa apuração?”, questiona.
O consultor do IPA destaca, por exemplo, que 98% da cadeia produtiva do leite é composta de pequenos e médios produtores. “Eles não têm como ter um gasto de R$ 1 mil, R$ 1,5 mil por mês para pagar um contador para fazer uma apuração. E eles não têm, talvez, um acesso à tecnologia e informações para fazer eles próprios a apuração do tributo”, ressalta. Na sua opinião, uma reforma tributária deve considerar essas especificidades dentro do setor produtivo.
Eduardo Lourenço esclarece ainda que uma das grandes diferenças entre as duas propostas que tramitam no Congresso é que a PEC 110 permite que o agro tenha um tratamento diferenciado, ao contrário da PEC 45. Na visão dele, não se trata de um privilégio, mas de uma abordagem que considera as características do meio rural. Ele cita o Convênio 100, que pode ser extinto, caso a reforma tributária seja aprovada da forma como está. O Convênio 100 garante redução de até 60% no ICMS que incide sobre os insumos agrícolas, como fertilizantes e defensivos. “Com a extinção (do Convênio 100), o produtor pode perder a competitividade em todo o setor produtivo”, aponta o especialista.
Patrícia Silva ainda chama a atenção para outros incentivos hoje vigentes e que também podem desaparecer com essa reforma tributária. É o caso da Lei Kandir que isenta de ICMS a exportação de produtos primários. “É preciso um olhar diferenciado para o agronegócio”, finalizou.
Saiba mais
Atualmente, existem duas propostas de reforma em discussão no Congresso Nacional, a PEC 45/2019 e a PEC 110/2019, que tem como base a unificação de vários impostos.
Nas duas situações, a carga tributária deve ser mantida, o que muda é a forma de cobrança que passa a ser no consumo e não na produção. A PEC 45, que está na Câmara, abrange a extinção de cinco tributos (PIS, COFINS, IPI, ISS e ICMS). Já a PEC 110, que está no Senado, unifica, além desses cinco tributos outros quatro impostos federais (IOF, salário-educação, Cide-combustíveis e Pasep).
A principal convergência entre as duas propostas é que a extinção desses tributos daria lugar a um só imposto sobre valor agregado de base nacional, o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), que incidiria sobre o consumo. A receita seria partilhada entre União, estados e municípios.
As duas PECs estão em discussão em uma comissão mista formada por deputados e senadores.