Em abril, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) anunciou que 180 armazéns foram colocados em estudo para venda ou concessão. Isso deixou agricultores preocupados, já que o Brasil não tem estruturas capazes de armazenar tudo o que é produzido e esse déficit prejudica os negócios de produtores rurais. A entidade, no entanto, garante que as vendas ou concessões não vão diminuir a capacidade estática atual do órgão.
De acordo com dados da companhia, atualmente, estão cadastrados na base de dados 16.691 armazéns privados. Juntos, eles totalizam uma capacidade estática de pouco mais de 170 milhões de toneladas. Capacidade estática é a quantidade de grãos, em toneladas, que cabe de uma só vez dentro de uma unidade armazenadora.
A Conab possui 64 unidades de armazenagem ativas com capacidade de aproximadamente 1,66 milhão de toneladas. Unindo capacidades privadas e públicas e comparando com a última projeção da safra atual, que é de colher mais de 270 milhões de toneladas, percebe-se que o país tem condição de estocar apenas 63% do que irá colher, quando o ideal seria ter espaço para guardar até 20% a mais do que produz.
Em meio a esse cenário, no fim de abril, a Secretaria Especial do Programa de Parcerias de Investimento do Ministério da Economia anunciou que a Conab disponibilizou para estudo de venda ou concessão 180 armazéns e 25 imóveis, como terrenos e prédios. A companhia garante que serão vendidos ou concedidos apenas os armazéns que já estão inativos e, com isso, espera melhorar os serviços oferecidos por meio de investimentos a serem feitos pelos compradores dos armazéns inutilizados em espécies de contrapartidas dos contratos.
“A ideia é diminuir o peso da Conab para o orçamento federal e, ao mesmo tempo, melhorar os serviços da entidade. Os contratos vão ser feitos e os modelos de concessões e parcerias público-privadas, no sentido de que a contraprestação dos nossos parceiros seja na forma de manutenção, de modernização e de até algum tipo de operacionalização dos nossos armazéns”, disse o superintendente de Armazenagem da Conab, Stelito Reis Neto.
Para o consultor em Agronegócio Ademiro Vian, a decisão do governo é de manter a participação no ramo da armazenagem. “Não quer passar toda a operação, quando não, ele deveria eleger os armazéns que ele quer se desfazer e se desfazer por definitivo. Então, essa parceria público-privada nessa questão eu não vejo muito sentido nisso. Em algumas áreas estratégicas, sim, mas na armazenagem não”, disse.
Política de Garantia de Preços
Os armazéns ativos são usados pela Conab na Política de Garantia de Preços Mínimos, com formação de estoques de produtos como café, mandioca e feijão, e também são usados para guardar os alimentos direcionados a ações sociais, como a distribuição de cestas básicas.
Atualmente, a companhia possui pouco mais de 57 mil toneladas de mercadorias guardadas nos próprios armazéns, além de ter mais 75 mil toneladas de mercadorias como arroz e milho estocados em empresas conveniadas.
Os armazéns públicos também podem ser locados pelos produtores rurais por meio de contratos de depósito. No início de maio, 527 produtores armazenavam suas mercadorias com a Conab, utilizando cerca de 177 mil toneladas da capacidade estática das estruturas públicas.
Para o presidente do Comitê de Logística da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), não há mais necessidade da empresa pública manter grandes estoques a fim de regular os preços de produtos agrícolas.
“Talvez a gente ainda tenha reflexo da época inflacionária em que você tinha que regular estoques e tudo mais para manter preço e algumas coisas assim. Eu não sei se essa questão de regulação de preço ainda faz sentido. Ainda acredito que a gente carrega muito uma cultura do passado, que os mais jovens não viveram, mas nós tivemos uma inflação muito alta no final dos anos 1980, início dos anos 1990. Naquele momento, fazia todo sentido regular preço. Agora, neste momento, não sei se pode ser um conceito de regular preço, porque o mercado se autorregula”, disse presidente do Comitê de Logística da Abag, Claudio Graeff
Alinhada a uma política econômica liberal, a Conab não tem planos de construir novos armazéns, nem para formar estoques e nem para suprir o déficit de armazenagem do país. A ideia é incentivar o produtor para que ele tenha independência nesse quesito.
“A nossa produção foi muito focada em produzir em quantidade. Quanto maior a minha produtividade por hectare melhor, quanto mais produto com menos espaço e menos recurso, melhor. Isso não está errado, está certo. Isso trouxe uma eficiência absurda para produção nacional e o Brasil é um dos principais produtores do mundo. Mas é muito importante que agora, que a gente já tem as tecnologias consolidadas, nós já somos o exemplo de produtividade e produção no mundo todo, precisa-se agora dar passos no pós-colheita. Nós temos tecnologia à disposição, mas realmente precisa que se tenha uma conscientização do produtor para ele poder lucrar com armazenagem do produto”, finalizou Stelito Reis Neto.