Os produtores de trigo do Rio Grande do Sul passaram por grande frustração no último ano. A expectativa era de colher 2,7 milhões de toneladas no estado, mas o clima fez a produtividade cair pela metade em muitas áreas, resultando numa produção tímida de 1,5 milhão de toneladas, com baixa qualidade do grão.
Os problemas tiveram início já no plantio, que precisou ser atrasado em função da chuva. Em setembro, as lavouras foram afetadas por forte geada, quando 80% dos grãos de trigo estavam em período de enchimento.
O produtor Édio Quaini lembra-se bem do orvalho congelado que cobriu as plantas. Ele teve 40% de quebra de safra, e metade do que colheu foi classificado como ruim. Quaini calcula que sua renda diminui 20%. “Toda a cadeia fatura em cima do trigo e, quando chega a hora de fechar a conta, falta sempre o do produtor”, diz ele.
O secretário de Agricultura do município gaúcho de Cruz Alta, Airton Becker, afirma que não foi surpresa que os fatores climáticos resultassem em grãos de menor qualidade. No entanto, ele assegura que mesmo esse trigo inferior conseguiu encontrar mercado.
Do total colhido pelo Rio Grande do Sul, 500 mil toneladas serão destinadas à indústria de panificação. Para completar a demanda estadual, os moinhos vão importar 700 mil toneladas de trigo.
O diretor executivo da Federação das Cooperativas Agropecuárias do estado (Fecoagro), Sérgio Feltraco, defende a criação de plano bianual para a cultura do trigo. Segundo ele, o projeto está sendo implementado em conjunto com entidades do Paraná e com a Organização das Cooperativas do Brasil (OCB). Para Feltraco, o plano poderá colocar a produção de trigo “nos trilhos” ou em uma posição onde haja mais segurança para o cultivo e a comercialização do grão.
Com menos trigo no mercado, o preço ficou mais alto em 2015 e está sendo mantido assim neste ano, ainda sentindo reflexos do que vem ocorrendo desde 2014, segundo o analista de mercado Jonathan Pinheiro.
“De lá para cá, a forte alta do dólar e a quebra de safra do Rio Grande do Sul favoreceram a alta do preço até agora”, diz.
A forte alta do dólar e a quebra de safra do Rio Grande do Sul favoreceram a alta do preço do trigo
Pinheiro acredita que a perspectiva para o grão em 2016 é de alta, com retomada de preços. O cenário, diz, é uma consequência da própria quebra de safra, que reduziu a oferta e valorizou o produto disponível.
O analista acredita que o preço pago ao triticultor possa subir cerca de 30%, o que representa R$ 200 a mais por tonelada de trigo. A recuperação seria potencializada pelo dólar e pelos valores praticados no mercado internacional. “É importante levar em conta também que o produtor vai ter uma elevação de custo com o dólar, mas ele ainda vai ter o trigo valorizado”, afirma Pinheiro.
Os produtores do Rio Grande do Sul parecem não confiar em projeções como as do analista. Cerca de 30% dos triticultores do norte gaúcho – região que semeia a maior área do estado – pretendem reduzir ou deixar de lado o cultivo do cereal neste ano.
Édio Quaini vem encolhendo a área de trigo na propriedade há quatro anos. Agora, procura por alternativas para substituir a cultura gradativamente. “Aveia branca, aveia preta, nabo forrageiro, centeio”, enumera.
Quem cultiva trigo está receoso em relação ao clima, ao preço e à liquidez do produto. Também causa desconforto a recente decisão da Argentina de acabar com os impostos sobre a exportação do grão. Com isso, o trigo vai chegar mais barato ao Brasil, o que colabora para uma expectativa de redução em até 30% da área semeada no Rio Grande do Sul, de acordo com o secretário Becker, de Cruz Alta.
Quaini revela desânimo em relação à cultura que produz há tantos anos, afirmando que seu valor não é corrigido nunca. “A soja responde ao câmbio, mas o trigo, não. Só vemos os custos e as dificuldades aumentarem”, afirma o produtor.