Clima e crédito marcam o ano da soja no Brasil

Em 2015, a safra de soja foi afetada por fatores como a valorização do dólar, falta de crédito, clima instável e sementes sem qualidade. Com este cenário, o resultado deve ser uma queda de produtividade na colheita e menos receita para o produtor

Fonte: Lucas Costa Beber/Nova Mutum (MT)

Os altos custos de produção da soja marcaram o início da safra 2015/2016. A desvalorização do real frente ao dólar fez com que o preço dos insumos subisse aproximadamente 30% em relação à safra passada. Para piorar, o crédito de pré-custeio não saiu, e os recursos oficiais do governo só começaram a ser liberados em julho. Resultado: teve muito produtor comprando sementes, fertilizantes e defensivos em cima da hora, quando o dólar já chegava a quase R$ 3,50.

O produtor foi pego com as calças nas mãos porque teve de comprar insumos agrícolas – fertilizantes, nitrogenado, fosfatado, potássio – no segundo semestre, com um dólar muito alto.

“Estimamos em mais de 30% o aumento do custo da produção neste ano. E isso pode comprometer o fechamento da safra. Não sabemos para onde vai a economia, se o dólar vai continuar nesse patamar. Infelizmente, é um momento de incerteza para o produtor”, diz Bartolomeu Braz, vice-presidente da Associação dos Produtores de Soja do Brasil (Aprosoja Brasil) e presidente da entidade em Goiás.

Em compensação, as exportações brasileiras do grão continuam em alta. Em novembro, houve acréscimo, em volume, de mais de 700% nas vendas externas, em comparação com o mesmo período do ano passado. O dólar alto contribuiu para melhorar os preços da soja em reais, mesmo com o valor da commodity em baixa na bolsa de Chicago.

Segundo Mauro Osaki, pesquisador do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), o mercado vinha com valores extremamente altos, acima da média histórica. De repente, uma sequência de quedas. O produtor brasileiro que convertia isso em reais estava preocupado por conta da taxa de cambio do final de 2014.

“A virada veio após a eleição presidencial de 2014. Veio com todo o pacote de maldade do governo. E nós tivemos um câmbio que inverteu a receita bruta do produtor, o que trouxe uma receita produtiva e um saldo positivo para safra 2014/2015”, diz Osaki.

Para José Carlos Hausknecht, diretor da MB Agro, nessa precificação do dólar hoje existe um componente político importante. “Quando começa a ter um andamento mais forte do processo de impeachment, os mercados tendem a reagir com a queda do dólar e aumento de bolsa etc. Assim, a tendência é, em caso de impeachment, haver uma valorização do real e uma redução do custo do produtor”, pontua o consultor de mercado.

Clima é o desafio

O clima também preocupa. O fenômeno El Niño, que em 2015 foi considerado um dos mais fortes dos últimos anos, trouxe chuvas acima da média para o Sul do país, o que deve deixar paranaenses e gaúchos no prejuízo. Já no Centro-Oeste e no Matopiba [Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia], o problema é inverso, falta chuva para a soja se desenvolver. A consequência, nos dois casos, será quebra de produtividade.

O problema é tão grande que teve produtor, como Felipe Bilibio, de Vera (MT), que decidiu substituir a soja por outra cultura nesta safra. “A gente não pode errar, temos que procurar fazer o melhor, ver o que vai plantar para ter um maior lucro por hectare. O clima a gente não controla”, comenta o sojicultor.

Sementes sem qualidade

Além das questões econômicas, o produtor de soja também enfrentou dificuldades na lavoura. A reclamação sobre a qualidade das sementes nesta safra foi quase unanimidade no país. O produto apresentou geminação abaixo do espero e muitos agricultores precisaram replantar a soja, o que gerou mais custos.

O agricultor Alberto Schopinski, de Nova Mutum (MT), é um dos que ficaram no prejuízo. Ele recebeu uma carga de 10 toneladas de sementes completamente mofadas e atrasou o plantio da safra.

“A cada dia sem solução, eu tenho uma perda considerável, porque perdemos a janela de plantio, ficamos vulneráveis a doenças como a ferrugem, mais pragas. É responsabilidade de quem vende dar um produto em condições de plantio. O produtor investe em adubo, em fungicida, no tratamento de sementes. Ninguém vai plantar para ter prejuízo”, critica Schopinski.

Novo vazio sanitário

A safra 2015/2016 ficou marcada também por novas regras de vazio sanitário da soja nos dois maiores estados produtores do Brasil: Mato Grosso e Paraná – este último muda o calendário na safra 2016/2017. Em Mato Grosso, o produtor só poderá plantar soja de 16 de setembro até 31 de dezembro, a partir de maio, o sojicultor já não poderá ter plantas vivas de soja no campo.

O Paraná, a partir do próximo ciclo, o plantio também fica restrito entre 16 de setembro até 31 de dezembro, com colheita até 15 de maio. Nos dois casos, o novo calendário vai inviabilizar o cultivo da soja safrinha, o que contraria os produtores rurais.

“O que mais nos preocupa é esta fronteira, onde temos o Paraguai, que está no sexto ano de soja safrinha e está apenas a 5 km de distância. Isso quer dizer que somos vulneráveis ainda. A preocupação com a soja safrinha são as plantas nas beiradas de rodovias, que nascem sem controle nenhum. Essas são as verdadeiras hospedeiras da ferrugem”, avalia o presidente do Sindicato Rural de Guaíra, Silvanir Rosset.

Não sabemos para onde vai a economia, se o dólar vai continuar nesse patamar. Infelizmente, é um momento de incerteza para o produtor – Bartolomeu Braz, vice-presidente da Aprosoja Brasil

Royalties

O ano também foi marcado pela disputa judicial entre a Monsanto e produtores rurais de Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina contra a cobrança de royalties da tecnologia Intacta na hora da comercialização, conhecida como cobrança na moega, que pode taxar em 7,5% o produtor que produzir a própria semente e não pagar o direito de uso da biotecnologia. Os agricultores venceram na primeira instância, mas na segunda instância, a Justiça do estado autorizou a volta da taxação.

A decisão não agradou os sojicultores, mas atendeu ao pedido da multinacional Monsanto, dona da tecnologia. “O agricultor quando compra a semente dele, ele paga pela tecnologia. O agricultor que salva a semente de forma legal, paga antecipado. Somente vai pagar na colheita aquele agricultor que não tem a semente certificada ou que não fez a semente salva legalmente. A gente está muito seguro que este é um sistema [de cobrança] que vai ser muito importante para a gente continuar fazendo novos investimentos”, argumenta o presidente da Monsanto no Brasil, Rodrigo Santos.