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Demarcação indígena: novas regras podem gerar mais conflito?

Antropólogos e parlamentares divergem em relação à aplicabilidade do parecer que proíbe a ampliação de terras já demarcadas

Fonte: Antonio Cruz/Agência Brasil

Parecer da Advocacia Geral da União sobre demarcação de terras indígenas assinado na última semana por Michel Temer deve gerar a revisão e a paralisação de processos de demarcação, mas especialistas acreditam que, ao contrário do que prevê o governo, os conflitos no campo devem aumentar a partir de agora.

A decisão da AGU determina que os órgãos da administração pública devem seguir 19 condicionantes definidas pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do caso Raposa Serra do Sol, em 2009. Com isso, fica proibida a ampliação de terras indígenas já demarcadas e deixa de ser necessário consultar as comunidades no caso de intervenções de interesse nacional na área, como ampliação de estradas ou exploração de matrizes energéticas.

O parecer também cita a tese do marco temporal construída no julgamento da época, que considerou constitucional a demarcação sob o argumento de que a terra estava ocupada por índios no dia da promulgação da constituição, em outubro de 1988. A medida pode causar a revisão de 435 áreas indígenas já regularizadas no país, que ocupam mais de 105 milhões de hectares. Os estudos para demarcar outras 114 áreas, que estão em mais de cinco milhões de hectares, também podem ser paralisados. Aos olhos da bancada ruralista, a medida é uma conquista.

“O parecer é importante porque, até hoje, a procuradoria da Funai e a AGU não entendiam que esse julgamento da Raposa Serra do Sol e o marco temporal eram interpretações da própria Constituição. Então, eles desobedeciam reiteradamente e isso vai botar uma pá de cal nesse assunto. É tão importante esse parecer porque vai obrigar a Funai e o Ministério da Justiça se manifestarem nos processos em curso de que só é terra indígena aquela ocupada efetivamente por índios em outubro de 1988”, falou o advogado da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), Rudy Ferraz.

As interpretações sobre a decisão do Supremo, no entanto, não são unânimes. Para ambientalistas, é um equívoco do governo usar o que foi decidido no caso Raposa Serra do Sol como consenso para todas as demarcações de terras indígenas no país, até porque nem mesmo o próprio STF deixou claro que a medida valeria para outros casos.

“O parecer faz uma interpretação equivocada da jurisprudência do STF, dizendo que há um entendimento consolidado, o que não é verdade, porque ele faz uma análise seletiva da jurisprudência do STF, pegando casos isolados”, disse Juliana Batista, advogada do Instituto Socioambiental.

O parecer gera divergências até mesmo entre especialistas que estudam demarcações de terras indígenas. Para o antropólogo Edward Luz, que já trabalhou na Funai, sem o parecer da AGU, o processo de demarcação era incerto e equivocado. “Eu poderia arriscar que, pelo menos, em 15% das terras indígenas, cerca de 650 terras, eu diria que umas 60 seriam altamente questionadas. Então, vai acontecer uma revisão e ela é necessária”, disse.

Já para o professor de antropologia da Universidade de Brasília, Henyo Barretto, o parecer da AGU apresenta ilegalidades e é fruto de um acordo político. “A convicção é fruto de um posicionamento de um parlamentar da bancada ruralista, o deputado Luiz Carlos Heinze, que em um vídeo que consta no próprio site da FPA diz que em abril ele teria acertado com a Casa Civil, a Presidência da República e a AGU esse parecer. Então, se é um parecer que não é demandado do ponto de vista técnico e administrativo, mas fruto de um acerto político, isso coloca em dúvida todas as boas intenções que se possa dizer que o parecer tem”.

Ambos concordam, no entanto, que ao contrário do que o governo diz, os conflitos no campo devem aumentar a partir de agora. “Os indígenas que vivem esses conflitos vão reagir e teremos um período de instabilidade provocado pelos indígenas”, disse Edward. “O dispositivo tem o poder de estimular ações que podem efetivamente levar o conflito em situações localizadas. A tendência é o acirramento de conflitos”, completou Henyo.

Outro lado

Procurado pelo Canal Rural, o deputado Heinze disse que “o parecer obedece criteriosamente decisão do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do caso Raposa Serra do Sol e, acima de tudo, em respeito a nossa Constituição”.

“Hoje, em audiência que participei com a advogada-geral da União, Maria Fernandes Mendonça, fui comunicado que todos que todos dos mais de 700 processos em andamento no Brasil, todos os judicializados deverão obedecer, imediatamente, todas as condicionantes do STF”, disse o parlamentar, que alegou ainda que o vídeo citado pelo professor Henyo Barreto foi “uma explicação às milhares de famílias de produtores rurais que vivem em constante insegurança e na iminência de perderem suas terras. Afinal, esse é um assunto que trabalho desde 2003, que se intensificou abril do ano passado”, finalizou.  

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