A maior procura por herbicidas dessecantes para a safra de soja 2021/22, que está sendo colhida, levou ao aperto na disponibilidade desses agroquímicos.
O aumento da área plantada com a oleaginosa exigiu, por tabela, mais dessecantes, cuja oferta não cresceu no mesmo ritmo.
Aplicado na lavoura pronta para ser colhida, o dessecante uniformiza as plantas, acelerando o amadurecimento dos grãos, encurtando o ciclo e garantindo maior rendimento na colheita.
Sojicultores alegam que há escassez do produto no mercado interno e falam em não cumprimento, por parte da indústria, dos contratos fechados com antecedência para a safra atual. Fabricantes, por outro lado, afirmam que houve quebra pontual no fornecimento de insumos para a temporada 2021/22, diante de dificuldades na cadeia global de abastecimento do setor, ainda reflexo da pandemia de covid-19.
As reclamações sobre a falta de produto recaem, majoritariamente, sobre o diquat – principal herbicida utilizado na dessecação, após a proibição, em 2020, do uso do paraquat pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
A Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil) diz que a indústria de agroquímicos não tem cumprido com os prazos de entrega dos insumos aos agricultores. “O atraso é generalizado. Alguns produtores não receberam nada. Outros receberam parte. O produto chega a conta-gotas”, relata o presidente da entidade, Antonio Galvan.
De acordo com ele, em períodos normais, o herbicida deveria estar nas fazendas no fim de dezembro, no máximo no início de janeiro. “O problema está instalado e a indústria não tem condição de responder. Não vai adiantar entregar o produto daqui para a frente”, afirmou Galvan, já que o momento de aplicar o dessecante é agora, na colheita da oleaginosa.
Além da oferta apertada do insumo, os produtores apontam para a disparada de preços. Segundo dados da Aprosoja Brasil, o custo para adquirir um litro do diquat passou de R$ 30 na safra 2020/21 para R$ 150 no atual ciclo. Outra opção para dessecação, o glufosinato de amônio – que é ainda mais caro -, também está escasso nas prateleiras das revendas, além do que há variedades de oleaginosa resistentes ao defensivo, ou seja, seu efeito é inócuo em determinadas variedades.
A Aprosoja Brasil alega que a baixa disponibilidade de dessecante para as lavouras pode implicar menor produtividade da safra. “É difícil estimar a perda total de rendimento pela falta de dessecação adequada. Conforme a área, a perda da produção pode alcançar até 10%, porque o grão verde acaba sendo colhido junto com o maduro e com maior umidade”, apontou Galvan. Segundo ele, o prejuízo é maior no Centro-Oeste e no Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), já que na Região Sul a produção foi menor, em decorrência da quebra na safra por causa da falta de chuvas e do calor excessivo em dezembro e janeiro.
A Syngenta, fabricante de agroquímicos e detentora do registro do herbicida diquat, disse, em nota, que se mantém “comprometida” com os agricultores brasileiros, mesmo diante de “desafios inerentes a uma crise sem precedentes”.
“Estamos dedicando os melhores esforços para o aumento dos volumes do produto a ser disponibilizado ao mercado brasileiro, diante de um aumento significativo da demanda”, disse a companhia, em nota. “Para tanto, buscamos alternativas adicionais de fornecimento de todas as fontes possíveis no mundo, incluindo novas opções na China”, continuou. “Ainda que cientes dos problemas atuais de abastecimento de diquat, os pedidos serão entregues nos próximos meses, sem renegociação de preços”, reforçou.
A Syngenta destacou ainda “ser favorável” a um ambiente de concorrência livre e que mais de 15 empresas possuem registro de comercialização do diquat no País. “Respeitamos a regulação vigente e não estamos medindo esforços para resolver a dificuldade pontual de abastecimento, bem como nos prepararmos para atender a uma demanda ainda maior de diquat. E, assim, oferecer aos agricultores os insumos necessários para o sucesso da próxima safra”, apontou no comunicado.
A CropLife Brasil, entidade que reúne empresas de defensivos e sementes e instituições de pesquisa, afirmou, também em nota, que fabricantes de agroquímicos vêm acompanhando “rigorosamente” a oferta de seus produtos no mercado brasileiro, em razão dos desequilíbrios globais observados desde 2021 no setor.
Na nota, a CropLife reconhece que houve “quebras pontuais” no fornecimento de determinados produtos na safra 2021/22, sem menção aos dessecantes. Segundo a entidade, as quebras pontuais ocorreram em regiões restritas, fenômeno descrito pela CropLife como “semelhante” ao ocorrido em outros países agrícolas.
A entidade apontou ainda que o desequilíbrio observado na cadeia de abastecimento foi de ordem global, ocasionado por fatores como desorganização da logística de importação, aumentos dos custos dos fretes internacionais e restrições à produção industrial na China – grande fornecedora de insumos agrícolas e de insumos químicos essenciais para fabricação de defensivos -, que busca adequar a sua matriz energética ao compromisso de redução das emissões de gases de efeito estufa.
“Esses atos de governo da China limitaram fortemente as opções de aquisição de insumos no mercado internacional”, observou a entidade. Sobre os riscos que permanecem no cenário de abastecimento de agroquímicos, a CropLife informou que acompanha a reorganização das cadeias de suprimento de insumos “em direção à normalização do abastecimento de produtos”.
O Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg) não quis comentar o assunto especificamente. Entretanto, em nota divulgada nesta semana, a entidade afirmou que suas 26 indústrias associadas têm relatado “frequentemente alguma instabilidade” no fornecimento de matéria-prima para a produção de defensivos agrícolas, “devido a problemas ligados à oferta global e à logística internacional, provocados pela pandemia e por questões internas de países produtores”, disse o Sindiveg. O Sindiveg não comentou diretamente sobre os atrasos reportados na entrega de dessecantes para a soja.
Já o governo federal, igualmente, disse que monitora a situação. Em nota encaminhada à reportagem, o Ministério da Agricultura afirmou que está “ciente do problema” e que tem feito reuniões com as empresas fornecedoras em busca de soluções. Na semana passada, a ministra Tereza Cristina se reuniu com representantes da indústria do setor para tratar do “cenário atual” do fornecimento de defensivos agrícolas. Participaram da videoconferência executivos da CropLife, da Associação Nacional dos Distribuidores de Insumos Agrícolas e Veterinários (Andav) e do Sindiveg.