Com entrega imediata e pagamento para fevereiro de 2022, a saca de soja foi negociada a R$ 182,50 no Porto de Paranaguá no dia 16 de setembro deste ano. O preço significativamente acima do que vinha sendo usualmente praticado nesta e nas demais praças brasileiras levou alguns seguidores do projeto Soja Brasil nas redes sociais a se perguntarem: “será que a comercialização do grão pode atingir 200 reais nos próximos meses?”. Entrevistamos um analista de mercado e um pesquisador do Cepea para entender quais são as chances disso acontecer.
É fato que a rentabilidade conquistada na lavoura nas últimas safras tem atraído novos produtores e expandido continuamente a área do grão, que se estende por territórios de pastagem, passa a se sobrepor a outras culturas e faz o preço do arrendamento de terra subir às alturas.
Assim, nada mais natural do que se especular a respeito dos preços a serem praticados na safra 2021/2022. O analista da Safras & Mercado, Luiz Fernando Gutierrez Roque, diz não acreditar que a saca será negociada a valor igual ou superior às duas centenas de reais na próxima safra. “Eu não apostaria nisso, mas é claro que não podemos descartar esse cenário”, pondera.
Fatores condicionantes
Para Roque, 200 reais seria uma realidade apenas se dois fatores se confirmassem. “Acredito que Chicago teria de subir pelo menos um dólar e meio acima do que está hoje, chegando próximo aos 15 dólares por bushel, e o dólar na casa dos R$ 5,80”, afirma.
Segundo o analista, Chicago pode alcançar esse patamar apenas se houver quebra de produção da soja no Brasil e nos Estados Unidos ou, ao menos, uma quebra muito acentuada em um desses países. O último relatório divulgado pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) nesta terça-feira, 12, não indica tal conjuntura. “Quanto ao câmbio, já esperamos muita volatilidade, ainda mais por 2022 ser ano eleitoral no Brasil. Diria que temos espaço para um câmbio firme no ano que vem”, avalia.
Em fechamento da última segunda-feira, 11, Chicago operou contratos da soja em grão com entrega em novembro a US$ 12,28 por bushel e o dólar comercial sendo negociado a R$ 5,5370 para venda e a R$ 5,5350 para compra.
De acordo com Roque, da Safras & Mercado, se a safra 2021/2022 for cheia, o aumento da oferta trará redução de preços. “Estamos trabalhando para abril e maio com preços em torno de R$ 150 em algumas regiões do Brasil. […] apesar disso, devemos ter preços bastante firmes em 2022 porque a demanda deve continuar firme e o Brasil deve continuar exportando muito”, analisa.
Mercado dinâmico
O pesquisador do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) e professor da Esalq/USP, Lucilio Alves, aponta que, por enquanto, Chicago está negociando patamares de 12,50 por bushel para, praticamente, um ano à frente.
“No entanto, de 15 de setembro para cá, o mercado mudou. Tínhamos um cenário de demanda mundial muito forte para soja e agora temos um ambiente de incertezas especialmente do lado dessa demanda, enquanto o crescimento da oferta continua. Isso implica em oferta prevalecendo sobre a demanda, ao contrário do que tínhamos há um mês, o que justifica termos preços de soja caindo nesta última semana [de 4 a 8 de outubro] mesmo com câmbio em alta e uma entressafra no Brasil. O mercado é muito dinâmico e se altera”, avalia.
Todavia, conforme o pesquisador, nem Chicago e nem os agentes esperam aumento de um dólar e meio em termos de mudanças de patamares para o Brasil. “Tanto isso é verdade que hoje temos prêmio de exportação na casa de dois dólares por bushel contra patamares de 25, 30 dólares para março, abril e maio de 2022”, conta.
Panorama 2022 para a soja
Alves, do Cepea, reafirma que o mercado não vê elevação cambial mais próxima dos seis reais. “A negociação na B3 para o câmbio é de R$ 5,50 até R$ 5,70 para meados do ano que vem, se alterando com frequência entre esses patamares. A perspectiva é que até agosto de 2024, Chicago feche a valores aproximados de US$ 12,50“, afirma.
Ainda que os dados de negociação não apontem para soja negociada a R$ 200, o pesquisador lembra que tudo pode mudar e usa outro grão como exemplo. “Ninguém esperava que o milho chegasse acima de 100 reais, mas chegou em algumas regiões do Brasil. Pela grande queda de produção desse grão na segunda safra, o preço era para estar disparando, mas o mercado está caindo porque o lado comprador não está conseguindo assumir preços maiores e repassar para frente”, explica.
Quanto à soja, porém, um aspecto é fundamental: preços melhores estão condicionados ao maior recebimento por parte de quem está esmagando, ou seja, maior rentabilidade agregada ao farelo e óleo. “Se não tiver receita desses dois subprodutos, não tem como pagar mais pela soja em grão. Nesse ponto, enquanto na última semana tivemos margem de 38 dólares por tonelada de soja esmagada para novembro 2021, para março do ano que vem esses patamares estão em 53 dólares”.
Desta forma, Alves analisa que a elevação de contratos para farelo e óleo ainda não estão sendo repassados integralmente para soja em grão. “Isso pode sinalizar um mercado de mais interesse comprador para frente pela boa margem”, acredita.
Custos de produção seguem desafiantes
Estudo realizado no noroeste de Minas Gerais pelo engenheiro agrônomo Anderson Barbosa Evaristo sobre o aumento de preços de dois insumos muito utilizados para a adubação da soja descobriu que os preços do MAP (fosfato monoamônico) e do KCI (cloreto de potássio) subiram 110% e 146%, respectivamente, entre agosto do ano passado e mesmo período deste ano.
Como uma das alternativas para a redução dos custos de produção, Evaristo aponta que se o produtor substituir o MAP pelo super fosfato triplo, pensando na adubação fosfatada, conseguiria ter uma economia de cerca de R$ 200 por hectare.