Com o objetivo de fomentar a produção sustentável, o Projeto PRO Carbono busca unir produtores e empresas do setor para ampliar a agricultura neutra, reduzindo emissões de gases de efeito estufa. O programa iniciou em 2021 e, agora, passa por uma nova fase de testes.
A produtora Maira Lelis, que cultiva soja na Fazenda Santa Helena, em Guaíra, interior de São Paulo, foi uma das primeiras 50 agricultoras a participar da iniciativa no Brasil e conta como as práticas ambientais foram iniciadas na fazenda de sua família. “Quando o plantio direto chegou em Guaíra, meu avô dizia que não daria certo, mas hoje isso é uma realidade que tem crescido em nossa propriedade”.
Segundo ela, atualmente a grande preocupação na propriedade é a construção do perfil de solo, tanto na parte física, aperfeiçoada com um mix de plantas de cobertura, como no biológica. “Trabalhamos de forma intensiva em todas as culturas porque o solo é vida e quanto mais a planta for saudável, acreditamos que maior será o sequestro de carbono”.
Maira também explica que parte da fazenda fica em pousio, com plantas de cobertura para fortificar o sistema de adubação. “Com esse sistema de rotação com as plantas de cobertura e com efeito alopático de cada planta, diminuímos em 50% o uso de herbicidas em nosso plantio e, ao longo de dez anos, aumentamos a produção em 40%“, detalha.
Desta forma, no sistema irrigado, a média produtiva da propriedade é de 90 sacas de soja por hectare. “Mas temos, em alguns locais da fazenda, colhido mais de 100 sacas por hectare de soja. Queremos essa média na fazenda toda”.
Resultados ambientais
A produtora destaca que, graças às técnicas recomendadas de manejo do Programa PRO Carbono, os primeiros dados mostram que a Fazenda Santa Helena consegue reter 82 toneladas de carbono por hectare. “Acredito que ao longo [do projeto], conseguiremos reter muito mais do que isso. A agricultura brasileira faz parte dessa grande mudança que precisamos ter enquanto planeta”.
Com esses princípios em voga, Maira acredita que, futuramente, o Brasil poderá ter uma soja com selo de emissão zero carbono. “Nesse projeto para o futuro o produtor terá retorno dentro desse sequestro [de carbono]. Muitas empresas vão exigir o selo de carbono zero, mas, mais do que isso, com boas práticas conseguimos diminuir os custos de produção e aumentar a nossa rentabilidade”, declara.
Consolidando o mercado
As boas práticas agrícolas na lavoura já são realidade em muitas propriedades, mas, para suprir as necessidades de alimento do planeta e atender as demandas internacionais, o tema precisa ser ampliado. Nesse contexto, integrar a produção a um ambiente saudável, com rentabilidade e equidade social é fundamental. O coordenador da Academia Global do Agro da Fundação Dom Cabral, Marcello Brito, salienta que já existem mercados de crédito de carbono consolidados na Europa, Estados Unidos e China.
“O Brasil caminha neste sentido. Há um projeto em discussão no Congresso Nacional, mas é um tema muito novo. Uma pesquisa mostrou que mais de 80% dos empresários do campo não têm conhecimento sobre o tema”, conta.
Segundo ele, o mercado de carbono, assim como o de pagamentos por serviços ambientais, depende de dois fatores para ter continuidade: credibilidade e integridade. “Isso significa compliance com a lei, ou seja, estar em dia com todas as leis do país, ter o seu Código Florestal complementado, estar em dia com as leis trabalhistas e sociais. Essa é uma necessidade premente para que se possa acessar esse mercado”, avalia.
Brito lembra, porém, que as pequenas propriedades não terão condições de, sozinhas, entrar neste mercado. “Esta será a hora de fazer a famosa integração de cadeia. Chame seu fornecedor, seu cliente, aqueles que são maiores, e faça uma cadeia para que esse levantamento do carbono, para que o reporte, a auditoria, tudo seja feito em conjunto com a diluição de custos”, explica.
Requerimentos internacionais
O produtor rural deve ter em mente as exigências que o mercado internacional faz para a compra de commodities. No caso da soja, o coordenador da Fundação Dom Cabral salienta que o principal requerimento é a rastreabilidade completa. “Essa demanda que comprova que determinado produto está livre de processos de desmatamento vem aumentando em vários mercados no mundo”.
Brito lembra que, por conta das imposições de países que adquirem produtos nacionais, cria-se, infelizmente, dois tipos de mercado. “De um lado, temos produtos que são exportados com altíssima rastreabilidade, o que garante ao consumidor internacional a procedência daquele produto, mas quando olhamos no mercado interno, tal exigência ainda não é feita”, adverte.
Segundo ele, a produção brasileira de soja é a melhor do mundo tanto em termos de qualidade quanto de sustentabilidade. “No entanto, temos questões que são externas à produção, principalmente a questão da destruição da Amazônia, garimpos ilegais, desmatamento, queimadas, toda essa destruição que assistimos hoje e isso afeta a produção nacional indiretamente. Não estamos na Amazônia, isso não é feito pelo agronegócio, mas pagamos um preço que não é nosso. Estamos pagando o preço da marca Brasil, porque todos os produtos que colocamos lá fora estão com a marca do ‘made in Brasil'”, afirma.
O programa Aliança da Soja é uma parceria entre o Canal Rural e a Plataforma Intacta 2Xtend e é exibido todas as segundas-feiras, às 13h35, com reprise às terças-feiras, às 6h30.