Autoridades de Santa Catarina discutiram nesta quinta-feira, 13, a viabilidade de uma rota do milho capaz de baratear a entrada do grão no estado e abastecer a pecuária local. O debate fez parte do 1º Fórum Mais Milho da safra 2019/2020, em Mafra (SC).
Na visão do vice-presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho), Glauber Silveira, a produção nacional deve mudar drasticamente nos próximos anos. “O cenário do milho nos próximos 3 ou 4 anos vai mudar totalmente por causa da produção do etanol de milho. Isso já está mudando em Mato Grosso e vai fazer com que as indústrias façam compras antecipadas, o que vai transformar o consumo do milho no mercado interno”, disse.
Diante desta realidade, a preocupação é com o abastecimento de Santa Catarina, que é o principal consumidor de milho no Brasil, um produto fundamental para abastecer a pecuária local.
“Falam da Rota do Milho há muito tempo e uma das alternativas é que ela saia do Paraguai, passando pela Argentina e chegando ao oeste de Santa Catarina. Mas essa é apenas uma alternativa, porque o Paraguai exporta cerca de 800 mil toneladas, o que é pouco”, analisou o presidente da Federação das Cooperativas Agropecuárias de Santa Catarina (Fecoagro), Claudio Post.
Para ele, a questão da logística é um grande problema no Brasil, já que as rodovias não aguentam o fluxo e muitas delas estão sucateadas. Por outro lado, o esforço para uma Rota do Milho vinda do Paraguai pode esbarrar na burocracia. “Não há entendimento e não vontade política para isso acontecer”, opinou.
Na visão de Cláudio Post, uma questão urgente seria melhorar a infraestrutura das BRs 163 e 158, e concluir projetos que envolvam as rodovias estaduais, que também precisam, segundo ele, aumentar a capacidade de transporte de cargas.
Esforço político
Um dos convidados do painel foi o deputado estadual pelo PSDB Marcos Vieira, um defensor da Rota do Milho e que está envolvido em diversos estudos e tratativas com representantes tanto na esfera estadual, como federal e com os demais países envolvidos na proposta.
“O Correto seria o governo federal ter mantido ao longo dos anos a ferrovia que liga São Paulo ao Rio Grande do Sul. No entanto, hoje o estado do Paraná destina grande parte da sua produção de milho para o etanol, então precisamos trazer esse grão de algum lugar que não seja tão longe como o Centro-Oeste, onde o valor do frete da saca pode ser de até R$ 20, o que não compensa. Já importamos da Argentina e do Paraguai via Foz do Iguaçu, mas uma Rota do Milho encurtaria esse caminho, que hoje é de aproximadamente 1 mil quilômetros”, falou.
O deputado faz parte de uma frente parlamentar em defesa da Rota do Milho e apresentou um cálculo que exemplifica o quanto o estado poderia economizar com fretes. “ Se a gente trouxer mil carretas, com 30 toneladas cada uma, vamos ter um frete de R$ 10 milhões. Se concretizarmos o sonho da Rota do Milho, essas mil carretas de milho poderiam ser trazidas para Santa Catarina por metade do custo. Agora, imaginem uma agroindústria que consome 170 carretas de milho por dia,quanto seria economizado em um ano? Isso aumentaria a nossa competitividade no cenário nacional e internacional.”
Fator Mercosul
Em sua participação, o secretário de Agricultura de Santa Catarina, Ricardo de Gouvêa fez um alerta importante sobre a necessidade do envolvimento federal e do Mercosul para que a Rota do Milho saia, enfim, do papel. “Já fizemos vários levantamentos, mas existe uma coisa chamada Mercosul e temos algumas normas que precisam ser cumpridas. Toda essa relação entre os países precisam passar pelo Mercosul, pois sem isso seria uma operação ilegal”, disse ele aos presentes.
Para ‘costurar’ esse acordo, Gouvêa se reuniu com a Receita Federal, representantes do Ministério da Agricultura e um representante do Paraguai. Em outra oportunidade, o embaixador Argentino no Brasil foi convocado e uma documentação foi montada entre estes representantes para que uma proposta possa ser enviada ao Mercosul.
“Esses encontros aconteceram em dezembro e, a minha expectativa, é de que ainda neste mês de fevereiro a gente tenha uma resposta para poder providenciar a assinatura dos presidentes e viabilizar a Rota do Milho”, disse.
Produção catarinense
O Fórum Mais Milho contou com a participação dos telespectadores do Canal Rural e uma das perguntas foi sobre a produção de milho no estado. De acordo com Glauber Silveira, essa questão é complexa, já que a região já produziu muito mais milho na primeira safra, mas passou a produzir mais soja por questão de preço e oportunidade.
E não é apenas na produção agrícola que o estado enfrenta uma mudança significativa. De acordo com o secretário Ricardo de Gouvêa, em breve Santa Catarina deve perder o posto de maior produtor de suínos em quatro anos. “Apesar de termos os ótimos índices de produtividade de milho, temos uma limitação geográfica e não temos tanta terra para produzir o milho que precisamos. Esse fator também está influenciando na pecuária, onde o Paraná já nos passou na produção de frangos e talvez em quatro anos passe também na produção de suínos. O que temos que fazer em Santa Catarina é nos concentrar em produtos gourmet, voltado para o mercado de alta qualidade”, argumentou.
Próximos passos
O futuro da Roda do Milho depende ainda de um longo processo de negociação, conforme alertou o deputado Marcos Vieira. Segundo ele, em breve será feita uma missão até a região de Misiones, na Argentina, e em seguida será feita uma visita ao Paraguai para também tratar do tema.
“Houve um esfriamento na relação com os argentinos no período eleitoral, que culminou na eleição do candidato da oposição, que não tinha um bom relacionamento com o governo brasileiro. No entanto, acho que os argentinos sairão ganhando com a quantidade de carretas que vão passar pela Argentina, gerando emprego e renda”, comentou.
Segundo Vieira, uma rota do milho que passe por Misiones pode fazer com que os argentinos passem a plantar o milho, e encurte ainda mais a distância até a região de Santa Catarina.
Obstáculos
Com uma visão um pouco mais pessimista, o presidente da Fecoagro apontou uma série de pontos que precisam encontrar um denominador comum, como a questão da legislação de cada país. “A cada reunião, temos mais obstáculos. Atualmente, temos a questão da tonelagem de cargas que se permite em cada país: no Brasil, aumentamos a capacidade com caminhões bitrem e tritrem. No Paraguai, há uma limitação para isso, não permitindo o bitrem e, na Argentina, só se permite 23 toneladas, que é inviável para o transportador”, disse.
Para Claudio Post, a solução mais viável seria a ampliação da Rota do Milho pelas BRs 158 e 163.
Ricardo de Gouvêa enxerga a burocracia para a construção de uma ferrovia como um entrave para a Rota do Milho. “Falar em ferrovia sendo construída pelo governo, com os travas que existem, vai demorar 30 anos e não vai sair. Precisa ser com concessão, que em menos de 10 anos ficam prontas”, disse.
Para Glauber, é preciso fazer um estudo de uma ferrovia que venha do Centro-Oeste para os portos de Santa Catarina, tendo terminais para abastecer a região oeste do estado.