Uma das palestras mais aguardadas pelos produtores de soja do país, durante a Abertura Nacional da Colheita da Soja, que aconteceu em Jataí (Go), nesta quinta-feira, 23, foi sobre a perspectiva de mercado do presidente da consultoria Agroconsult, André Pessôa. Para ele, o Brasil não tem nada a temer sobre o acordo atual entre China e Estados Unidos. De quebra, acredita que os brasileiros estão fazendo certo ao se anteciparem e já venderem a safra de 2021.
Antes de falar sobre a comercialização, o consultor confirmou a perspectiva de que o país possa colher a maior safra de todos os tempo e assim, superar os Estados Unidos como maior produtor de soja do mundo.
“De maneira geral nossa expectativa, com o crescimento da área plantada chegando a 36,7 milhões de hectares, é provável que consigamos colher 124,3 milhões de toneladas, superando a safra 2017/2018 que, na nossa avaliação, o país colheu 122 milhões de toneladas. Um recorde histórico e a primeira vez que o país se consolida como maior produtor mundial do grão”, diz.
Pèssôa diz considerar, em sua perspectiva, uma quebra de safra no Sul do país, principalmente no Rio Grande do Sul. Para ele, o Nordeste que também sofreu com seca no início do plantio deve recuperar suas lavouras com as recentes chuvas.
“Talvez a única região do país que traga alguma preocupação é a região Sul. Especialmente o Rio Grande do Sul, devido uma longa estiagem de dezembro. Isso também aconteceu em algumas áreas de Santa Catarina e do Paraná, que exigiu algum replantio e cuidados especiais. De lá pra cá o clima se regularizou e ajudou a recuperar o potencial produtivo. No Nordeste, com a regularização atual das chuvas que está acontecendo, há uma perspectiva de boa produtividade”, afirma ele.
Os desafios para 2020
Para Pessôa a safra boa virá acompanhada de desafios, principalmente em relação as exportações e o acordo entre China e Estados Unidos, na primeira fase de tentar dar fim à guerra comercial.
“O acordo inicial os americanos fizeram com que os chineses se comprometessem a elevar as importações de produtos agrícolas dos EUA, chegando a um patamar de US$ 36,5 bilhões de toneladas em 2020 e US$ 43 bilhões de dólares em 2021. Isso preocupa por que essas negociações nunca passaram de US$ 30 bilhões (na safra 2012/2013). Em 2017, antes da guerra comercial foi de US$ 24 bilhões, de onde virá todo esse volume, da soja, que sempre foi a commodity mais vendida?”, comenta.
China X Estados Unidos
O que parece um problema para a sojicultura brasileira, pode não ser. Para o consultor, o desafio dos americanos é que eles não têm sequer soja para atender esse crescimento de demanda e, isso é muito positivo para o Brasil.
Pessôa destaca que a primeira redução de demanda por soja no mercado internacional da história, em 2019, afetado pelo surto de peste suína africana na China e, consequentemente, a demanda mundial, fez a demanda cair de 155 milhões de toneladas de 2018, para 145 milhões de toneladas em 2019.
“A boa notícia é que o número de focos da peste estabilizou, mostrando que as medidas fitossanitárias impostas na China, estão estancando a doença e já há indícios de um início de recuperação do rebanho chinês de suínos. Ainda demorará pelo menos três anos para que o rebanho volte aos patamares pré doença”, explica.
Outra perspectiva considerada boa pelo consultor de mercado é que o rebanho suíno chinês será restabelecido com novas exigências fitossanitárias e, portanto, ampliará o consumo de farelo de soja, pois o alimento é o mais adequado em grandes produções comerciais.
“Parte daquele rebanho perdido, sequer consumia farelo de soja. Agora a suinocultura do país será renovada e trará aumento de demanda. E isso vai começar esse ano, o reflexo é que das 83 milhões de toneladas importadas no ano passado, já devemos voltar para um patamar de 90 milhões esse ano”, diz Pessôa.
Acordo X oferta
Apesar da perspectiva de um aumento da concorrência com os Estados Unidos, devido o acordo com a China, Pessôa destaca que o mercado mundial deve tornar a crescer.
“Ainda não vamos retornar ao patamar de 155 milhões de toneladas de consumo mundial em 2020, mas devemos chegar próximo a 150 milhões este ano. Em 2021, tudo indica, que já teremos patamares recordes no consumo mundial de soja, puxado por um recorde de importação na China”, afirma.
Brasil e China em 2020
No Brasil, para 2020, a perspectiva do consultor de mercado é uma redução nas exportações de soja para o mercado chinês. Em 2019, no período de janeiro a dezembro, foram exportadas 58 milhões de toneladas para os asiáticos, já os americanos embarcaram somente 20 milhões de toneladas, (sendo 14 milhões no primeiro semestre).
“Para esse ano, com o efeito do acordo entre a China e os EUA, a expectativa é vender 52 milhões de toneladas para a China e os EUA ampliem para 34 milhões de toneladas, sendo boa parte disso no segundo semestre. O primeiro semestre continuará sendo dominado por vendas do Brasil”, conta Pessôa.
A China deve importar um pouco mais também. Em 2019 importaram 87 milhões de toneladas, e em 2020 devem comprar pelo menos 91 milhões de toneladas. Pessõa confirma que o Brasil já vendeu 60% dessa safra de soja para os chineses e ainda deve vender mais, afinal possui produção, diferente dos Estados Unidos que registraram quebra de safra.
“Hoje, a soja brasileira é mais competitiva que a americana. As autoridades chinesas acabaram de dizer continuarão comprando soja de onde for mais barato, e pelo menos até maio o mais competitivo é o Brasil. De US$ 20 a US$ 25 por toneladas mais barata, sem falar na questão da qualidade, que a nossa é melhor também”, afirma.
A perspectiva de preços para 2020 é que os valores na Bolsa de Chicago fiquem na casa dos US$ 9,5 por bushel. Já os prêmios no Brasil devem ficar um pouco menores. “Na virada do ano, com a safra americana voltando a patamares grandes, os prêmios no Brasil podem cair mais um pouco, mas até lá já teremos negociado bastante”, comenta.
Brasil se antecipa para 2021
Se a perspectiva até ao fim de 2020 não é tão ruim assim para os brasileiros. Uma mudança no pensamentos dos produtores do país, pode estar garantindo um 2021 tranquilo também. Pessôa acredita que os Estados Unidos devem produzir mais soja no ano que vem, até por um aumento de área prevista, passando de 30,6 milhões de hectares, para 34,3 milhões em 2020/2021.
“Ou seja, preocupação sim, mas nada de perder o sono. os produtores do país foram muito competentes na comercialização para 2020, vendendo mais de 60% antes de iniciar a colheita, o que ajudará a enfrentar os desafios desse ano. Para 2021 já vendemos 6%, bem acima da média para o período. Então os produtores brasileiros já estão se antecipando e diminuindo os riscos para 2021, pois já travaram vendas e trocas de insumos, prova de maturidade e evolução do produtor brasileiro no quesito”, diz.